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28 de dezembro de 2010

MEGA-PROJETO, MEGA-RISCOS - BELO MONTE MAIS RISCOS QUE BENEFÍCIOS






Belo Monte: um mega-projeto com mega-riscos para a sociedade brasileira 


 Telma Monteiro

Publicado em dezembro 28, 2010 por HC
O relatório “Mega-projeto, Mega-riscos” vem em bom momento, como um alerta inequívoco de que Belo Monte é ainda um mega-projeto que pode se transformar em mega-obra com mega-riscos para a sociedade.

[EcoDebate] Uma publicação lançada no dia 23 de dezembro analisa os principais riscos financeiros, legais e de reputação para os investidores e a sociedade como um todo, se for construido o Complexo Hidrelétrico Belo Monte, no rio Xingu, Pará.  Na forma de relatório estão descritas as incertezas sociais, ambientais, tecnológicas, econômicas e jurídicas que caracterizam o empreendimento.
Os riscos financeiros são inerentes a qualquer projeto e devem ser estimados para minimizar a possibilidade de que erros de cálculo possam resultar em irreparáveis perdas para a sociedade. O relatório “Mega-projeto, Mega-riscos” mostra os cuidados que devem cercar projetos como o Complexo Belo Monte, que envolvem dinheiro público garantido pela emissão de títulos do Tesouro Nacional, além de vultosos investimentos de fundos de pensão.
A análise foi feita tendo como referência um extenso material baseado em  riscos financeiros,  legais e de reputação. Os autores[1] adotaram uma metodologia semelhante à das agências de rating, que permite enxergar como os riscos de um projeto como o de Belo Monte podem recair sobre a parte mais vulnerável: as populações tradicionais locais, povos indígenas e a biodiversidade.
Os principais fatores de risco financeiro identificados no relatório incluem aqueles associados às incertezas sobre os custos e quantitativos para a construção do empreendimento  -  fatores geológicos e topológicos, de engenharia e de instabilidade, em valores de mercado; aqueles relacionados à incógnita que é a capacidade de geração de energia –  devido à  sazonalidade do rio Xingu (que se agravará com as mudanças climáticas) e à baixa retenção esperada dos reservatórios, se confirmada a decisão do Conselho Nacional de Política Energética  (CNPE) de proibir a criação de outros reservatórios a montante (rio acima) para regularizar a vazão do rio; e à incapacidade do empreendedor de atender os programas de mitigação e de compensação exigidos no processo de licenciamento.
Os riscos financeiros poderiam se desdobrar em riscos legais e de reputação que levariam a grandes prejuizos  para o erário. Esses riscos refletem o fato de que preceitos legais, nacionais e internacionais, sobre direitos humanos e proteção do meio ambiente e outras políticas e “salvaguardas” de responsabilidade socioambiental têm sido desconsiderados no planejamento energético e no processo de licenciamento ambiental do projeto.
Um dos principais pontos que o relatório aborda diz respeito ao Banco Brasileiro de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que vai emprestar diretamente os recursos necessários para construir Belo Monte.  Para tanto o Conselho Monetário Nacional (CMN) tomou a decisão, em abril de 2010, de aumentar os recursos disponíveis no BNDES para financiar hidrelétricas. O alvo seria Belo Monte. Essa decisão foi um disfarce para ajudar a viabilizar o empreendimento, usando dinheiro do Tesouro Nacional.Construir Belo Monte é um risco, e isso está claro no relatório Mega-projeto, Mega-riscos. 
Os recursos para financiar obras civis, máquinas e equipamentos nacionais, montagens, planos de mitigação de impactos sociais e ambientais, treinamento e infra-estrutura social, poderiam atingir até 80% do valor (im)previsto para o empreendimento. É preciso deixar claro que esse valor ainda não está definido e, conforme as diversas fontes de informação, ele variaria entre R$25 e R$40 bilhões.
Mesmo que o BNDES tenha critérios que estabeleçam em 25% do patrimônio de referência do banco o limite para empréstimos a um único grupo econômico (R$ 14,5 bilhões no caso de Belo Monte), esse seria o maior financiamento na história do banco, superando o empréstimo para Jirau, no rio Madeira, de R$11 bilhões. É o papel do BNDES fazer uma avaliação dos riscos que assombram o empreendimento, amplamente divulgados por alguns setores da sociedade. São riscos financeiros associados aos altos custos de mitigação e compensação de impactos sociais e ambientais.
O BNDES, para surpresa de todos, aprovou o empréstimo para a construção do empreendimento e anunciou um dia antes do lançamento do relatório “Mega-projeto, Mega-riscos”, um adiantamento de R$ 1,087 bilhão para Belo Monte, sem ter conhecimento da decisão do Ibama sobre se há ou não condições de emitir a Licença de Instalação, indispensável para dar início às obras.  O modelo de classificação de risco do BNDES, hoje questionado por economistas, foi desenvolvido ao longo de 1993 pelo Departamento de Crédito e continua em uso.
Outros pontos importantes são abordados no relatório, como o descumprimento da política ambiental do Grupo Eletrobras pelas subsidiárias Eletronorte e  CHESF, que juntas lideram o consórcio Norte Energia, vencedor do leilão de Belo Monte  com 49,8% da SPE. Deveriam “estar em conformidade com as políticas públicas, em especial aquelas relativas a meio ambiente, recursos hídricos, mudanças climáticas e energia, com os marcos legais e regulatórios pertinentes, bem como com os acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário”.
Os fundos de pensão detêm 25% da SPE Norte Energia e, além das políticas de responsabilidade social e ambiental, são signatários dos Princípios para o Investimento Responsável da ONU (UN-PRI). A participação dos fundos de pensão, que foi forçada pelo governo federal, dá a dimensão dos riscos de investir em Belo Monte, já que alguns conselheiros votaram contra.  No caso da Previ, que pretende financiar 10% de Belo Monte de maneira indireta,  o conselheiro Paulo Assunção argumentou que o empreendimento teria baixa rentabilidade; a Fundação Caixa Econômica Federal (Funcef) planeja injetar  R$ 163 milhões, 2,5% do seu capital; a Petros quer contribuir  com R$ 650 milhões,  mesmo sem a aprovação de sua Diretoria Executiva e do Conselho Deliberativo.
Riscos de construção vão desde incertezas sobre os dados geológicos, escavações de rocha e solo – apontados em acórdão do TCU – até a cota máxima a ser atingida quando o reservatório estiver cheio e que poderia afetar uma população maior do que a prevista. Riscos de operação, riscos jurídicos, risco de perda da diversidade, riscos sociais – migração desenfreada, saúde, riscos de extinção de indígenas em isolamento voluntário, tudo está muito bem delineado no relatório.
relatório vem em bom momento, como um alerta inequívoco de que Belo Monte é um mega-projeto que pode se transformar numa mega-obra com mega-riscos para a sociedade. As falhas irresponsáveis nos processos de planejamento e licenciamento nada mais são que um reflexo dos interesses  políticos que se sobrepõe à justiça e às leis vigentes no Brasil.
Leia o relatório na íntegra, clicando aqui
[1] Brent Millikan – International Rivers, Roland Widmer – Eco-Finanças – Amigos da Terra, Amazônia Brasileira, Telma Monteiro, socioambientalista e pesquisadora e Zachary Hurwitz – International Rivers
Telma Monteiro, colaboradora e articulista do EcoDebate, é coordenadora de Energia e Infraestrutura Amazônia da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé
https://twitter.com/TelmaMonteiro

EcoDebate, 28/12/2010
Gentileza do jornalista HENRIQUE CORTEZ



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