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30 de setembro de 2014

UMA ANÁLISE DE ESPECIALISTAS SOBRE A SITUAÇÃO DO VELHO CHICO

Nascente principal do rio São Francisco completamente seca

Nascente do São Francisco seca

Rio, totalmente brasileiro, tem bacia hidrográfica que abrange 504 municípios e sete Estados.

CORREIO DA PARAÍBA – Edição de 24/09/2014
São Paulo (Folha Press) – Pela primeira vez na história, a nascente do rio São Francisco, situada no Parque Nacional da Serra da Canastra, em Minas Gerais, está completamente seca.
O acontecimento é simbólico, mas não significa, necessariamente, que o curso do rio será interrompido mais adiante.
“Não afeta todo o rio porque ele é muito grande, tem outros tributários que vão ajudando a mantê-lo. A gravidade maior é a seca. É uma questão simbólica”, diz o diretor do parque, Luiz Arthur Castanheira.
Segundo Castanheira, a falta de água na nascente do rio, que tem 2.700 quilômetros de extensão e atravessa seis Estados e o Distrito Federal, foi detectada por funcionários da universidade, que visitam o local diariamente. “O pessoal mais antigo aqui do parque está assustado (com a seca)”, diz.
O rio nasce a cerca de 1.200 metros de altitude, em um dos pontos mais altos do parque, que tem 200 mil hectares de área.
A água brota de diversos “olhos d´água” e pequenos riachos que formam a nascente do Velho Chico, como o rio é afetuosamente chamado.
“Se a nascente seca, (o rio) vai ficar com pouca água até o primeiro desaguar de outro rio (no São Francisco)”, explica o vice presidente co Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Ele não soube dizer em que ponto isso ocorre.
A estiagem rigorosa não afeta somente a nascente. A represa de Três Marias (a 224 km de Belo Horizonte), a primeira do São Francisco, está com a vazão crítica (6%, apenas).
Segundo Soares, a vazão atual é de cerca de 60 m³/s, quando o esperado mesmo para épocas de estiagem é de 300 a 350 m³/s.
“Não choveu a quantidade esperada, mas há necessidade de manter a vazão para a energia elétrica, o que diminui o reservatório”, explica Soares. “Precisamos trabalhar com as pessoas e com as empresas para que seja feito o uso racional da água”.
De acordo com o Comitê, a previsão é que a situação seja normalizada com o aumento no volume de chuva em meados de outubro.
Chuva vai recuperar São Francisco
Comitê da Bacia Hidrográfica espera que período chuvoso, em outubro, acabe seca na nascente.
CORREIO DA PARAÍBA – Edição de 28/09/2014
Brasília (Abr) – A nascente principal do Rio São Francisco na Serra da Canastra, em Minas Gerais, que secou, tende a se recuperar com as chuvas previstas para a segunda quinzena de outubro. Segundo o vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Wagner Costa, a seca é provisória e a situação da nascente deve se normalizar com a chegada das chuvas.
Membros do Comitê reuniram-se na tarde de sexta-feira, em Belo Horizonte, para discutir o assunto. Segundo Costa, a longa estiagem reduziu a vazão nos diversos rios que abastecem a calha do São Francisco. “Com a volta das chuvas esperamos que a nascente retorne. Ela é considerada a nascente principal, só que não influencia como um todo, apenas naquele primeiro trecho do rio. E ela não está, em princípio, seca permanentemente. Havendo a infiltração da água, o lençol freático será abastecido”, explicou.
O diretor do Parque Nacional da Serra da Canastra, Luiz Arthur Castanheira, segue o mesmo raciocínio. “Com a seca, os pequenos córregos que formam a nascente, na região do parque, secaram. Agora é ficar de olho na previsão do tempo e esperar chover”, disse Castanheira. Ele destacou que outras nascentes continuam abastecendo o rio, que corre normalmente nos trechos mais baixos da nascente principal.
Mesmo acreditando que a situação tende a se normalizar com a chegada das chuvas, o CBHSF alerta para o uso da água, principalmente em regiões dependentes do rio. “Temos que fazer uma campanha pelo uso racional da água, é um assunto para agora. Em um primeiro momento, a vazão reduzida pode causar problemas com a biodiversidade. Com menos vazão, o rio reduz o ambiente para flora e fauna, e isso pode causar algum desequilíbrio biológico no futuro”, ressaltou Costa.
A reunião co Comitê também concluiu que certas providências são necessárias para preservar as nascentes e os lençóis freáticos que abastecem o São Francisco. O plantio de árvores às margens do rio e no alto dos morros e montanhas está entre as medidas recomendadas, assim como o uso adequado do solo, impedindo que a água da chuva escorra antes de ser absorvida pela terra.
Tais medidas ajudam a infiltração da água da chuva no solo, abastecendo os lençóis freáticos e, consequentemente, as nascentes. “O trabalho de revitalização do rio tem que ser constante, contínuo daqui para frente. É bom que haja um choque como este (nascente que secou) para que as pessoas tomem consciência e adotem uma atitude positiva de recuperação dos rios, usando a água com parcimônia”, afirmou Costa.

Sobre o assunto:
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Situação lamentável do São Francisco em Iguatama (MG)
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COMENTÁRIOS
João Suassuna – Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, Recife
Com a exaustão da principal nascente do rio São Francisco, creio ser prematuro todo e qualquer juízo de valor que se faça a respeito do retorno do fluxo dessa nascente. Com a forte degradação ambiental existente naquela região, a chegada de novas chuvas, não garante, em absoluto, a infiltração da água no solo, e nem tampouco a volta da normalidade da nascente.  Achei que a matéria em questão, trás consigo uma falta de sensibilidade em relação à gravidade da situação. O fato de dizer que a nascente não influencia o rio como um todo, mas apenas aquele primeiro trecho da sua bacia, e de que as outras nascentes e afluentes continuam abastecendo o rio São Francisco, não procede. Lembro que foi a primeira vez que essa exaustão ocorreu e, portanto, apenas um estudo mais detalhado, no local da nascente, pode vir a comprovar esse fato. O que o rio São Francisco está necessitando é de uma avaliação sistêmica e mais detalhada em toda a sua bacia hidrográfica.  Tem-se, necessariamente, que se começar um estudo, que considere a exaustão da nascente principal do rio; passando pela situação deplorável em Iguatama (região próxima a sua nascente), onde o Velho Chico corre apenas com um filete de água; a interrupção dos fluxos do rio Verde Grande, um de seus principais afluentes; os baixos volumes acumulados na represa de Três Marias (apenas 6%); a possibilidade de, em Pirapora, se andar de bicicleta no leito seco do rio; a interrupção da hidrovia que transporta a produção de grãos da região, pela incapacidade de se navegar com embarcações de grade calado; a possibilidade de o Velho Chico interromper seu fluxo em um trecho de 40 km, a jusante de Três Marias; a impossibilidade de o projeto da transposição atender as demandas previstas para o abastecimento de 12 milhões de pessoas e para a irrigação de 350 mil ha no Setentrional nordestino que está sedento; os recordes históricos das afluências volumétricas do São Francisco, na represa de Sobradinho (chegou a atingir 330 m³/s) e os lançamentos volumétricos, de Sobradinho para o Sub-Médio e o Baixo São Francisco, de apenas 1.100 m³/s, contrariando uma determinação do IBAMA, que exige um volume mínimo, na foz do rio, de cerca de 1.300 m³/s.  Temos que dar uma resposta à sociedade, a todas essas questões, e iniciar um programa verdadeiro de revitalização da bacia do rio, para que possamos entregar, às gerações futuras, um rio em condições de continuar fazendo jus ao nome que recebeu, de rio da integração nacional.       

José do Patrocínio Tomaz Albuquerque - Hidrogeólogo e Consultor
Prezado João Suassuna.
 
Este assunto foi objeto de debate na ABRH-Gestão. Transcrevo aqui a minha mensagem com o diagnóstico que fiz sobre o tema:
“Já disse isso aqui: o grande e maior papel desempenhado pelas águas subterrâneas, contidas e emescoamento em Sistemas Aquíferos é assegurar a vazão de base de sistemas hidrográficos. No caso do Alto São Francisco, pelo menos até Pirapora, esta vazão é proveniente de sistema aquíferos pouco produtivos, uma vez que estão relacionados com rochas de baixa permeabilidade, como são as rochas constituintes dos grupos ou formações geológicas denominadas de Canastra, Três Marias e Bambuí, todas metamórficas e de idades Pré-Cambrianas (Período Proterozóico), em que pese a presença de algumas camadas de quartzitos (alguma permeabilidade) integrando os dois primeiros grupos, e de calcários metamorfisados (mármores), principal componente do Grupo Bambuí, dotado de permeabilidade cárstica, mas mal distribuída (heterogênea) no espaço, embora um pouco mais permeáveis . Em média, a vazão de base em Três Marias situa-se em torno de 317 m3/s, com um mínimo minimorum verificado no ano de 1971, mês de Julho (seca) de 58 m3/s (Freitas & Gondim Filho, 2004). Não é difícil perceber que, com a seca atual e com a exploração dos sistemas aquíferos por poços e, ainda, com o desmatamento, esta vazão tenha atingido valores inferiores a esse. No caso das nascentes do São Francisco (existe mais de uma), todas situadas no Grupo Canastra, constituinte cristalino da serra homônima, a vazão das mesmas se tornou nula pelas mesmas razões, influindo, também, ponderadamente, o desmatamento extensivamente praticado na bacia. Tudo isto significa que, enquanto não considerarem, na gestão de bacias hidrográficas e de reservatórios superficiais nelas construídos, o papel desempenhado pela vazão de base, os rios e suas bacias, sob a ocorrência de secas, cada vez mais severas, terão suas vazões reduzidas e, no extremo, os seus regimes hidrológicos alterados, ficando profundamente dependentes do regime das chuvas e de sua pluviometria. É isso, no meu entender, o que está ocorrendo. O uso do volume morto pode até resolver o problema das demandas múltiplas, socioeconômica e, principalmente, ambientais, por certo período, mas a solução da oferta segura passa, impreterivelmente, pelas relações hidrológicas entre as águas fluviais e suas vazões de base. Repor a cobertura vegetal e disciplinar a exploração das águas subterrâneas de forma a repor e não comprometer, respectivamente, quantitativa e qualitativamente, estas relações é imperativo de uma gestão sustentável”.
Adicionalmente, sou forçado a discordar da avaliação feita pelo vice-presidente do CBSF, Wagner Costa, segundo o qual “a situação da nascente deve se normalizar com a chegada das chuvas”. Não necessariamente. Isto vai depender do volume infiltrado nos aquíferos situados a montante, certamente afetados em sua capacidade de infiltração original, e da velocidade de circulação da água subterrânea no interior destes aquíferos. Não tenho dados sobre esta velocidade (produto da permeabilidade K com o gradiente hidráulico i, ou seja v = Ki). Mas, é uma velocidade muito pequena, algo em que K é da ordem de 10-3 m/dia e i se situando em torno dos 10-2 (admensional), do que resultaria uma velocidade de escoamento de, apenas, 10-5m/dia, ou seja, 0.01 mm/dia. Comparada com a velocidade do escoamento direto (diretamente dependente das chuvas), da ordem de m3/s, o fluxo de água subterrânea é muito lento e leva meses e até anos para ser reposto. Com o cessar das chuvas e anulação do escoamento direto (praticamente, isso se verifica ao cabo de algo como 2 a 3 dias), a fonte continuaria praticamente seca, uma vez que para repor uma vazão da ordem de 60 m3/s, se necessitaria de uma área de contribuição (frente de escoamento vezes espessura saturada) muito grande.
O que poderia melhorar a capacidade de infiltração afetada pelo desmatamento e ocupação do solo a montante, seria tomar medidas, além das citadas pelo Sr. Wagner Costa, para implantar o que em hidrogeologia se denomina de infiltração induzida. Esta consiste em retardar o escoamento direto da rede hidrográfica a montante das nascente, pela construção de valas ou de pequenos diques que aumentem o tempo de residência do escoamento direto, facilitando, com isso, o processo de infiltração.
Essa a minha avaliação.
Abraços,
Patrocínio
Roberto Malvezzi (Gogó) - Membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Bahia
Caro João,
Minha convicção é que não podemos olhar apenas o fato de secar a nascente...Esse fato só é compreensível dentro do processo...E o processo é de depredação contínua da bacia do São Francisco. A nascente rebrotar é provável...Improvável é que as autoridades e o mundo econômico mudem sua relação com a bacia do São Francisco, que mude de uma relação de exploração e esgotamento para o cuidado e a sustentabilidade. 
Abs.
Gogó.


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