Sem enganação
Enviado por Agostinho Vieira -
21.11.2013
Coluna publicada no Globo de hoje:
Lá se vão quatro anos, desde o dia 2 de outubro de 2009, quando o presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), Jacques Rogge, anunciava em Copenhague o nome da sede das Olimpíadas de 2016: Rio de Janeiro. Festa nas ruas, alegria pela vitória e uma agradável sensação de esperança. Afinal de contas, teríamos tempo e dinheiro para “construir” uma cidade mais limpa e organizada.
Entre os compromissos assumidos no Caderno de Encargos da Rio-2016, dois chamavam a atenção: a limpeza das lagoas da Barra e a despoluição da Baía de Guanabara. Este último vinha sempre acompanhado de uma ressalva. Não se falava em despoluir totalmente a Baía, mas limpar 80%. De onde terão surgido esses 80% ninguém sabe. Por que não 70% ou 90%? Talvez tenha sido uma mistura de cálculo político com marketing. Prometer 60% pareceria timidez e 100% seriam inverossímeis. O tempo se encarregou de mostrar que não teremos nem uma coisa nem outra.
Passados 50 meses, desde a comemoração nas poluídas areias de Copacabana, quase nada aconteceu. Tivemos uma sucessão de ações paliativas, com nomes criativos e poucos efeitos práticos. Ouvimos falar da “Sena Limpa 1”, da “Sena Limpa 2”, das Unidades de Tratamento de Rio (UTRs), das ecobarreiras e agora dos ecobarcos. Dez embarcações estão sendo contratadas por R$ 3,1 milhões para cumprir a tarefa inglória de recolher as 100 toneladas de lixo flutuante que são jogadas diariamente na Baía de Guanabara.
Alguns dirão que é melhor fazer isso do que não fazer nada. Concordo. Na verdade, faltando pouco mais de 30 meses para os Jogos Olímpicos, não há muito mais o que fazer mesmo. Temos que agir sobre as consequências para não aparecer muito mal nas imagens que serão transmitidas para o resto do mundo. Mas seria bom parar com a enganação e assumir. Estamos usando cinta porque não conseguimos mais emagrecer. A peruca, os cílios postiços e a maquiagem completam o visual.
O pior é que até para essas ações emergenciais enfrentamos problemas. Deveríamos ter cinco UTRs operando nos rios da Baixada de Jacarepaguá. Apenas uma está em funcionamento. A do Arroio Fundo, que foi construída nos Jogos Pan-Americanos de 2007. Faltam as do Arroio Pavuna, Pavuninha, Anil e Rio das Pedras. O Estado tem R$ 620 milhões em caixa para fazer a dragagem das lagoas da Tijuca, Marapendi, Camorim e Jacarepaguá. São cinco milhões de metros cúbicos de lama e lixo que não estão sendo retirados por uma pendência judicial.
Pelo cronograma do projeto “Sena Limpa”, a praia de Ipanema já deveria se considerar “limpa” desde o final do ano passado. Mas o boletim de balneabilidade do INEA mostra que ela esteve imprópria para o banho durante quase todo o último verão. Áreas da Barra da Tijuca, que já teriam o seu esgotamento teoricamente concluído, continuam apresentando sinais de vazamento.
O fato é que obras de saneamento básico são tão fundamentais quanto difíceis de fazer. Despoluir a Baía de Guanabara e universalizar a coleta e o tratamento de esgoto nos 15 municípios que circundam o cartão postal é uma tarefa para 15 anos de trabalho duro. São 8,5 milhões de pessoas jogando lixo e detritos nos rios da região. Só da Zona Oeste são 100 milhões de litros de esgoto lançados diariamente na Baía.
Esse problema já poderia ter sido resolvido se o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), iniciado em 1992, tivesse sido levado a sério. Faltou responsabilidade, continuidade e apreço pelo dinheiro público. Agora, o Estado dá início a um novo projeto nessa área, o Programa de Saneamento Ambiental dos Municípios do Entorno da Baía, mais conhecido como PSAM. Ele começa com um foco correto em planejamento e gestão de longo prazo.
Pela primeira vez na história, municípios da Baixada Fluminense estão elaborando Planos de Saneamento. Magé, Guapimirim, Cachoeiro de Macacu, Tanguá e Rio Bonito já têm os seus. Com isso, podem se habilitar a receber financiamentos federais. Um plano regional também está em fase de conclusão. O PSAM possui uma verba inicial de US$ 632 milhões. Parte veio do BID e parte dos cofres do Estado. Além disso, o governo federal já autorizou o investimento de mais R$ 1 bilhão.
Mas esse dinheiro não será suficiente. Só para a Baixada serão necessários mais R$ 4 bilhões. Recursos que deverão ser usados nos próximos 12 ou 15 anos. Nada a ver com Jogos Olímpicos ou Copa do Mundo. Os eventos esportivos passam, as cidades e os seus problemas ficam. A despoluição da Baía de Guanabara virou uma obra folclórica. Ninguém acredita mais que ela venha a acontecer. Cabe aos futuros governos mostrar que é possível. De verdade. Sem enganação.
Fonte: ECONOMIA VERDE
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