Água para todos | |||||
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De fevereiro a abril, o semiárido brasileiro é uma das regiões no país com maior índice pluviométrico. Contrariando o senso comum de que a região semiárida mais populosa do mundo é desértica. O problema, como pesquisadores apontam, não é a falta de chuva e sim a sua concentração e a má distribuição. Da população que vive na zona rural, 67% dela, até há alguns anos, não tinha acesso à rede geral de abastecimento de água.
Porém, nos últimos anos, o cenário e a rotina de milhões de brasileiros tem mudado devido à implantação de dois programas, o “Programa 1 Milhão de Cisternas” (P1MC) e o “Programa 1 Terra 2 Águas” (P1+2), ambos com apoio do Governo Federal. Se antes a população tentava combater a seca, hoje ela aprende a conviver com ela.
Os dois programas são encabeçados pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), instituição que atualmente integra cerca de 3 mil organizações não governamentais distribuídas em nove estados brasileiros. O público alvo são famílias rurais de baixa renda, inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. Para reforçar as metas do programa, em 2013, a presidenta Dilma Rousseff sancionou a Lei 12.873, que institui o “Programa Cisternas” como política pública do “Programa Água para Todos”, este que integra o “Programa Brasil Sem Miséria”.
Durante oito meses, Carlos Eduardo de Freitas Lima, 31 anos, foi um dos agentes do P1MC, dentro do programa aplicado no município de Apuiarés, Ceará. Ao todo foram entregues 350 cisternas na região.
“Antes a vida deles era muito difícil, eles tinham que caminhar muito para ter acesso à água potável e, muitas vezes, esta água era barrenta, não era boa para beber. Hoje, eles podem ter água com qualidade na porta de casa. Ter isso era um sonho quase impossível para a grande maioria dos moradores”, conta Carlos.
Tecnologia e cidadania
Certificada como tecnologia social em 2001 pela Fundação Banco do Brasil, as cisternas de placas pré-moldadas começaram a ser implantadas em 2003 e hoje já somam cerca de 900 mil cisternas. Destas, 80 mil foram entregues pela Fundação Banco do Brasil, o que corresponde aproximadamente a 300 mil pessoas de 133 municípios de nove estados brasileiros: Alagoas, Bahia, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Segundo Naidison Baptista, coordenador da ASA e integrante do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), a meta é atingir 1 milhão e 300 mil cisternas, que é a demanda atual de famílias no semiárido brasileiro. “Nos últimos quatro anos não tivemos nenhuma vítima fatal da seca. Não teve gente que morreu de sede, não tivemos saqueamentos de mercados, nada disso”, lembra Naidison.
Para José Caetano Minchillo, presidente da Fundação Banco do Brasil, o programa também tem como objetivo empoderar as famílias e as comunidades ao incluir a própria população na construção das cisternas, fomentando a mão de obra e o comércio. “Não existe sustentabilidade sem protagonismo. Mais do que garantir o acesso à água para consumo, o processo de construção das cisternas tem base em ações de desenvolvimento local e de inclusão socioprodutiva. A seca passa a ser compreendida pela população como uma situação com a qual se pode conviver em harmonia”, explica Minchillo.
A tecnologia por trás das cisternas é simples e de baixo custo. A água da chuva é captada do telhado por meio de calhas e armazenada no reservatório com capacidade para até 16 mil litros, o suficiente para atender uma família de cinco pessoas durante um período de estiagem de oito meses. Já o “Programa 1 Terra e 2 Águas”, que caminha paralelamente ao P1MC, tem como meta fazer com que produtores consigam armazenar água para animais e plantações.
Ao democratizar o acesso à água, os dois programas resgataram não só a saúde, mas também a cidadania e a autoestima de famílias inteiras. “O impacto é grande demais. Principalmente para as mulheres, que antes caminhavam cerca de 6 km para buscar duas latas de 20 litros de água. Hoje, essas pessoas estão libertas. Elas podem utilizar o seu tempo para outra coisa”, conta.
Muitas das mulheres passaram a dedicar seu tempo aos estudos, à direção de sindicatos e à organizações sociais. Com a água também veio o empoderamento de famílias e uma independência política. “A água era uma espécie de cabresto no semiárido. Hoje as pessoas dizem que votam em quem quiserem. Então, você entra com uma dimensão de cidadania impressionante, pois você cria condições para que as pessoas se libertem e elas estão assumindo isso. Elas podem voltar em fulano, não porque ele trouxe água, mas porque elas têm um direito respeitado”, defende Baptista.
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