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4 de julho de 2013

UTI ambiental: diagnóstico da água III, artigo de Osvaldo Ferreira Valente

Depois de, nesta UTI ambiental, termos analisado o ciclo hidrológico (diagnóstico da água I) e a bacia hidrográfica (diagnóstico da água II), vamos ver o que acontece quando os dois se encontram. Vamos ver como a bacia hidrográfica se comporta em relação a algumas fases do ciclo hidrológico e discutir algumas interações importantes para a produção de água.
Começamos por estudar o fluxograma da Figura 1. Nele temos a bacia hidrográfica recebendo volumes de água por precipitações (chuvas) e processando tais volumes em seu ecossistema. Vemos que parte é devolvido à atmosfera pela evapotranspiração, outra se escoa sobre a superfície, em forma de enxurrada, atingindo cursos d’água, e outra se infiltra no solo. Do volume infiltrado, parte fica retido nas primeiras camadas de solo e é retirado pelas raízes das plantas e transpirado para compor aquela parte devolvida à atmosfera por evapotranspiração; a outra parte desce ao longo do perfil do solo e se acumula sobre obstáculos impermeáveis (camadas rochosas ou de argilas
adensadas), ou em fendas e interstícios de rochas, formando os aquíferos subterrâneos, também conhecidos como lençóis subterrâneos. Tais aquíferos poderão abastecer nascentes e cursos d’água ou serem explorados por meio de poços de diversas naturezas.

UTI ambiental: diagnóstico da água III - Figura 1
Figura 1

A primeira observação importante sobre o fluxograma é o fato de os cursos d’água serem formados por volumes de água provenientes dos lençóis subterrâneos (através das nascentes) e das enxurradas. Se o ecossistema da bacia hidrográfica privilegia a formação de enxurradas, temos o aumento rápido de vazão dos cursos d’água logo após chuvas fortes, por exemplo, o que pode provocar cheias e inundações, e diminuição dos volumes que irão ter aos lençóis subterrâneos. Os lençóis funcionam como grandes reservatórios: se com pouca água, não têm como abastecer as nascentes, que são as torneiras mantenedoras das vazões, mesmo que não haja chuvas no momento; se com pouca água, também não têm como resistir por muito tempo e os cursos d’água viram intermitentes, ou seja , não conseguem resistir a períodos de secas mais prolongados.
A Figura 2, que mostra um corte no perfil de uma encosta em bacia hidrográfica, pode ajudar no entendimento do fluxograma. O escoamento superficial é a enxurrada e o subsuperficial é uma enxurrada oculta logo abaixo da superfície e que apenas demora um pouco mais para chegar diretamente ao curso d’água.

UTI ambiental: diagnóstico da água III - Figura 2
Figura 2

Vamos explorar mais um pouco as duas Figuras, assinalando, em primeiro lugar, que ainda não é possível controlarmos a quantidade de chuva que atinge determinada bacia hidrográfica. Temos que trabalhar, portanto, com os valores medidos, quer momentâneos, quer médios de dias meses ou anos, encontrados em organizações especializadas como o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). Quando a chuva atinge a superfície de uma bacia, podemos ter comportamentos variados de componentes do ciclo hidrológico, tais como: a) Dependendo da permeabilidade da superfície, o volume de enxurrada pode variar, alterando, concomitantemente, o volume infiltrado; b) Mesmo que a baixa permeabilidade seja uma condição intrínseca do solo, o volume infiltrado pode ser aumentado com obstáculos que diminuem a velocidade da enxurrada, ou seja, é possível colocar mais água no interior do solo se ela tiver dificuldade de se movimentar pela superfície; c) No total de água perdido por evapotranspiração, em torno de 70% do recebido por chuvas, em média, há um domínio altíssimo da transpiração, o que pode ser alterado com o uso de vegetação de menor poder evaporativo.
Vimos, portanto, que a interação de componentes do ciclo hidrológico com a bacia hidrográfica pode variar muito de uma situação para outra, permitindo, assim, a possibilidade de se fazer um planejamento de uso que privilegie o processamento da água de chuva, atendendo aos interesses da produção de água.
No próximo artigo desta série de ‘UTI ambiental’, daqui a uns quinze dias, vamos usar números e fazer uma contabilidade de água na bacia hidrográfica, para melhor entendermos o funcionamento dessa fábrica natural de água.
Osvaldo Ferreira Valente é engenheiro florestal, especialista em hidrologia e manejo de pequenas bacias hidrográficas, professor titular, aposentado, da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e autor de dois livros recém-publicados: “Conservação de nascentes – Produção de água em pequenas bacias hidrográficas”e “Das chuvas às torneiras – A água nossa de cada dia”; Colaborador e Articulista do Portal EcoDebate.
Nota do EcoDebate: sobre o mesmo tema sugerimos que leiam, também, os artigos anteriores desta série:

EcoDebate, 04/07/2013
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