THE URBAN
EARTH
Reflexões para um mundo urbanizado
Tietê e Tamanduateí, dois rios espremidos em canais que não os acolhem
O mapa que vemos aqui mostra a cidade de São Paulo, em 1897. Sei que, por seu tamanho, ele não permite que se tenha uma visão mais precisa das ruas e antigas instituições, mas ele mostra bem aquilo sobre o que quero falar nesse post: dois fundos de vale importantíssimos com várzeas imponentes, que aos poucos aterramos, soterramos, urbanizamos…. em azul está lá o Tietê, ainda com todas as suas “voltas” ou seus meandros, em amarelo, o Tamanduateí, parte já retificado (quando sumiram suas “sete voltas”, que ficavam onde hoje é o Parque D. Pedro II e a Rua 25 de Março – área que se chamava Várzea do Carmo), mas ainda conservando as “voltas” onde hoje está a Baixada do Glicério e a Avenida D. Pedro I, no Ipiranga.
Vamos olhar primeiro para o Tamanduateí e pensar um pouco no que fizemos nesse fundo de vale: primeiro retificamos e canalizamos o rio…. depois abrimos avenidas largas às suas margens, e então, no que sobrou, loteamos e construímos.
Na primeira fase da retificação, criamos um parque. Sim, o Parque D. Pedro II antes de ser um terminal de ônibus urbano cercado de pistas por todos os lados foi um parque. Tinha até uma ilha: a Ilha dos Amores.
Mas um dia veio a prefeitura e resolveu que ali era melhor haver um terminal: isso foi em 1968, quando se iniciaram as obras para abrir a Avenida do Estado. O prefeito na época era Faria Lima que fez uma série de obras viárias na cidade, inclusive parte das marginais Pinheiros e Tietê. Não podemos colocar toda culpa nele: o final da década de 60 e a década de 70 caracterizam-se por uma visão urbanística que já foi chamada de rodoviarista, onde se acreditava que a abertura de grandes “artérias” viárias poderia resolver os problemas de congestionamento de trânsito, que então se iniciavam. Antes dele, foi prefeito Prestes Maia, que tinha o mesmo ideário.
Sobrou um pouco da área desse parque: aquela ilha verde no meio da avenida do Estado e que abraça o Palácio das Indústrias, e que é hoje popularmente conhecida como ‘faixa de gaza”, uma vez que é local onde ocorrem roubos frequentes.
E a rua 25 de Março? Ali somente existia um beco, o Beco das 7 Voltas, que ficava às margens do rio Tamanduateí…. afinal era ali que chegava a Ladeira do Porto Geral! E toda essa região sempre alagou na época das chuvas, de um lado por que o rio drenava um grande território, de outro, porque o Tietê tinha um curso muito lento e não conseguia escoar rapidamente as águas volumosas que lhe chegavam pelo Tamanduateí (e por uma série de outros rios) na época das chuvas.
Primeiro se “espremeu” o Tamanduateí dentro de um canal de concreto, mais tarde foi a vez do Tietê. Se você olhar de novo para o mapa lá de cima verá quantas voltas o rio Tietê dava no interior do município de São Paulo, e a grande área que ele ocupava que formavam as suas várzeas. Em 1897, somente três bairros estavam implantados ou projetados sobre essa várzea: mais a leste, a Villa Bernardino de Campos (projetada), ali onde hoje fica parte do Tatuapé, mais ao centro a região à esquerda da Avenida Tiradentes no caminho da Ponte Grande (hoje Ponte das Bandeiras), e mais a oeste uns arruamentos onde hoje é a Barra Funda.
A retificação e canalização, em sua maioria realizada entre 1940 e 1950, transformaria a várzea em áreas ocupadas por loteamentos e construções, e a partir dos anos 50, em uma grande via expressa, quando as marginais começariam a ser construídas. No Tietê, ainda que no começo do século 20 os projetos tenham proposto a implantação de parques em parte das margens, isso nunca chegou a acontecer, a várzea, local de obras e lamaçal acabou se transformando em local de construções e asfalto.
O projeto mais conhecido que viabilizava alguns parques na várzea do Tietê é o do Engenheiro Francisco Saturnino de Brito, que tem sido usado como exemplo de um bom projeto, no que se refere ao respeito aos cursos d’água em áreas urbanas. Mas ele não foi implantado, e hoje seria muito ousado recuperar parte dele, uma vez que os lagos que ele propunha fossem construídos para regularizar a vazão do Tietê, estariam no local onde hoje temos grandes equipamentos urbanos, como o Parque da Juventude (antigo Carandiru) e o Campo de Marte.
Decisões políticas que se deram no passado, que definiram a ocupação das margens desses dois rios no Município de São Paulo são uma herança que temos que lidar todos os verões. Não sabemos, de fato, se não teríamos alagamentos se esse projeto de Saturnino de Brito tivesse sido implantado, ou se ainda tivéssemos, íntegro, o Parque D. Pedro II, mas com certeza eles seriam menores. A pergunta que temos que fazer hoje é, ao pensarmos novas alternativas para nos locomovermos na cidade de São Paulo, uma vez que se locomover em automóveis se mostrou um desastre, se temos como rever a ocupação dos fundos de vales por ruas e ruas e mais ruas…. e principalmente desses dois fundos de vale, e daquele outro também importante, e do qual não falei aqui, o do Rio Pinheiros.
Nós paulistanos, por nascimento ou por adoção, estamos prontos para sacrificar nossas avenidas, nossas marginais, nossos espaços para a circulação de inúmeros automóveis, se isso significar menos enchentes, menos perdas dos moradores das baixadas, menos caos? Queremos mesmo uma cidade mais agradável, mais funcional, com mais qualidade, ou preferimos continuar entupindo as ruas com nossos carros e por isso, por favor, não nos tirem as inúmeras pistas, as ruas largas, as freeways!!!!
Talvez esteja na hora de começarmos a pensar nisso….
Aqui pelo meu lado, estou iniciando uma pesquisa sobre os projetos de retificação e canalização do Tietê. Aproveito para pedir a quem tiver fotos antigas do Rio Tietê, antes, durante e logo depois da canalização, até os anos 1950, para me cederem uma cópia. Hoje é fácil escanear e enviar por email. Ajudem-me nessa pesquisa. Obrigadíssimo, desde já. Fonte: http://theurbanearth.net/
ÁGUA - QUEM PENSA, CUIDA!
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