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11 de junho de 2012

SITUAÇÃO DA ÁGUA LEVA GRANDE PREOCUPAÇÃO NA RIO+20 QUE EVITA O TEMA




Rio Piracicaba seco no interior de São Paulo, uma
das regiões mais críticas em água no Brasil

Corrida mundial pela água acelera na Rio+20

Por José Pedro Martins
A água não faz parte oficialmente do temário da Rio+20, mas a conferência marcará a aceleração da corrida mundial pelo uso dos recursos hídricos. Coalizões e alianças de movimentos sociais e organizações não-governamentais de todo mundo estão alertando para o risco da Cúpula da Terra reforçar as pressões pela transformação da água e outros recursos naturais em commodities, no contexto da chamada Economia Verde. Como contraponto, essas coalizões e alianças vão reforçar na Rio+20 o direito humano à água e ao saneamento, já garantido pela Assembleia Geral das Nações Unidas mas ainda questionado por países como Estados Unidos, Canadá e Reino Unido. A partir da Cúpula da Terra, de qualquer forma, serão intensificadas as estratégias pelo uso da água, cuja deterioração em escala global vem inquietando o setor empresarial, que já identifica sérias ameaças à continuidade dos seus negócios.
O grande sinal das fortes preocupações no setor corporativo global com a situação da água foi a publicação em 2009 do relatório “Traçando o Nosso Futuro da Água - Quadros econômicos para informar a tomada de decisões” (“Charting Our Water Future – Economic frameworks to inform decision-making”). O relatório foi uma iniciativa do The 2030 Water Resources Group, criado em 2008 por The International Finance Corporation (IFC), grupo ligado ao Banco Mundial e que tem a missão de fornecer “investimentos e serviços de consultoria para a construção do setor privado nos países em desenvolvimento”.
Passaram a integrar o The 2030 Water Resources Group alguns dos nomes mais fortes do setor corporativo mundial, verdadeiros líderes em seus respectivos segmentos: The Barilla Group, grupo global na área de alimentação; Coca-Cola Company, grupo global de bebidas; Nestlé S.A., um dos líderes globais na área de produtos de nutrição e saúde; SABMiller plc, um dos maiores fabricantes de cerveja do mundo;  NewHolland Agriculture, companhia de equipamentos agrícolas de atuação mundial; StandardChartered Bank, instituição global do setor financeiro; e Syngenta AG, uma das estrelas globais do setor de agronegócios. Foi esse conjunto de megacorporações que financiou a ajudou a construir o relatório “Charting Our Water Future”, indicando a forte preocupação quanto ao futuro da água em todos os setores da economia globalizada. A empresa de consultoria McKinsey & Company, uma das gigantes do setor, também participou do processo.
A principal conclusão do estudo é que, mantidas as tendências atuais de crescimento da economia e sem intervenções significativas no controle do uso dos recursos hídricos, incluindo uso mais eficiente deles, as necessidades globais de água crescerão dos atuais 4,500 bilhões de metros cúbicos (ou 4,5 mil quilômetros cúbicos) para 6,900 bilhões de m3 em 2030. Serão portanto 40% a mais de uso da água do que a disponibilidade hídrica conhecida pode fornecer, que seria de 4,200 bilhões de m3 (3,500 bilhões m3 de águas superificiais e 700 m3 de água aubterrânea). Haverá então um déficit de 2,800 bilhões de m3 de água em 2030, mantido o atual status quo, segundo o estudo.
O maior incremento no uso da água será verificado na agricultura, que terá uma demanda de 4,500 bilhões de m3, contra os atuais 3,100 bilhões m3.  Entretanto, o aumento necessário na demanda de água pelo setor industrial também será significativo, dos atuais 800 milhões de m3 para 1,500 bilhão de m3, quase o dobro. Não é por acaso que todos os setores econômicos, industriais e agrícolas, estejam tão preocupados com o futuro da água, pois o que está em jogo é a continuidade dos seus negócios.
A participação do setor privado – O relatório “Charting Our Water Future” inclui quatro estudos de caso, relacionados ao aumento da demanda de água até 2030 na Índia, China, África do Sul e Estado de São Paulo, no Brasil. Em conjunto esses países mais São Paulo representarão 42% da demanda global prevista de água até aquele ano, de acordo com o estudo. Na Índia é previsto um déficit de 50% de suprimento de água, contra 25% de déficit na China, 17% na África do Sul e 14% em São Paulo.
De acordo com o documento, o enorme desafio para garantir o suprimento de água demandada em 2030 apenas será superado em função de um mix de ações em três áreas: maior eficiência no uso dos recursos (o que diz muito respeito a aumento de produtividade na agricultura), aumento das fontes de água disponíveis e as prioridades econômicas escolhidas por cada país. O relatório adverte que ainda representa uma enorme incerteza o impacto das mudanças climáticas nesse balanço da disponibilidade hídrica e o aumento da demanda previsto.
O prefácio do relatório é assinado pelos próprios CEOs das empresas patrocinadoras, o que dá uma medida da importância que elas dão ao tema.  No momento em que o estudo apresenta as soluções possíveis, é citado o possível papel do setor privado. De acordo com o documento, as medidas necessárias para fechar a lacuna entre a disponibilidade e a demanda previstas representarão “oportunidade para o setor privado”. Estas oportunidades apareceriam em cinco áreas principais: na necessidade de aumento da produtividade no setor agrícola (para que seja produzido maior quantidade de alimentos com volume menor de água); no incremento da participação das instituições financeiras, que tendem a ser “um ator importante” no financiamento das ações (o documento nota que o setor de água sofreu até o momento com um “crônico sub-investimento); no maior investimento pelas indústrias em “soluções de segurança hídrica”; no fornecimento de tecnologia, seja para dessalinização ou reuso de água, seja para melhoria da irrigação ou redução do consumo; e na maior eficiência do uso de água no setor de construção.
O setor privado “é crítico para a transformação do uso da água em um país”, afirma o documento. O estudo aponta um importante papel do setor privado em três áreas: como provedor de capital, como usuário de água e como provedor de soluções. Segundo o relatório, em termos de tecnologia apropriada, por exemplo, para aumentar a eficiência, já existiriam soluções que ”parecem maduras para adoção”, embora, em muitos casos, os usuários finais não possam “mobilizar o capital necessário”. As soluções para esta situação existem, entende o documento, incluindo as parcerias público-privadas.
De acordo com o relatório, os investidores do setor privado “nem sempre estão dispostos a assumir os riscos associados ao setor da água”. Uma solução para a redução desses riscos seria ”através do acoplamento do veículo de investimento privado com fundos de “assistência técnica” em grande parte compostos de subsídios ou de capital público”.

O relatório dá ênfase especial às mudanças institucionais necessárias para a melhor gestão dos recursos hídricos. “Muitos argumentam que o desempenho institucional está no coração das reformas do setor da água”, diz o documento, completando que a mudança institucional incluiria ”a melhoria da sua estrutura de governança e a redução da influência política na gestão”. E faz uma sugestão claramente indicando a maior presença do setor privado na gestão dos recursos hídricos: “Como no caso de reformas orientadas para o mercado, os países podem aprender a partir de histórias de sucesso em muitos outros sectoes, de estradas e de transporte aos cuidados de saúde”. Está se falando, claro, da privatização desses setores.

O direito humano à água – Ingredientes como o relatório  ”Charting Our Water Future” são muito claros a apontar que será acelerada a corrida pelo uso da água nos próximos anos. E a Rio+20 tende a ser um marco, daí a mobilização de muitas organizações em torno da necessidade de que a conferência reafirme o direito humano à água e ao saneamento, aprovado pela Assembleia Geral da ONU em 28 de julho de 2010, mas com a abstenção de 41 países, liderados por Estados Unidos, Canadá e Reino Unido. Dois meses depois o Conselho de Direitos Humanos da ONU ratificou o direito humano à água e ao saneamento, uma vitória para muitos setores que encontravam há anos a resistência dos setores privatistas.

Na Rio+20, o direito humano à água será defendido, entre outras organizações, pela Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (Assemae), do Brasil. “É muito importante que a Rio+20 reafirme esse direito, assegurando-se a universalização do acesso à água e ao saneamento, sob controle social”, afirma Silvio Marques, presidente da Assemae.

 Os próximos passos para que o direito humano à água e ao saneamento, aprovado pela ONU, seja de fato concretizado serão tema, por exemplo, de um encontro no dia 13 de junho, no Rio de Janeiro, promovido por France Libertes, Public Services International, Food & Water Watch e Council of Canadians. São algumas das principais organizações que vem lutando pelo direito humano à água e ao saneamento.

“Os direitos humanos à água e saneamento são agora direitos juridicamente vinculativos, iguais a todos os outros direitos humanos e este mandato deve ser promovido no Rio de Janeiro”, afirmam as organizações promotoras do debate. Elas citam dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo a qual cerca de 20 por cento da população mundial vivem em países onde a água é escassa. Em 2025, 800 milhões de pessoas estarão vivendo em países ou regiões com escassez absoluta de água (quando a demanda supera a oferta), e dois terços do mundo viverão em áreas submetidas ao estresse hídrico, completam as organizações.
Elas advertem para o risco da privatização do setor de água: “Empresas privadas de água têm sido muitas vezes incapazes de cumprir as obrigações para os acionistas, e ao mesmo tempo cumprir a sua obrigação de manter e expandir os sistemas de água e fornecer água de qualidade aceitável, a preços acessíveis. As empresas privadas têm pouco incentivo para expandir o acesso à água potável, quando grandes setores da população são pobres e incapazes de pagar as taxas do mercado”.

O desafio da implementação do direito humano à água é igualmente o tema de mesa-redonda dia 16 de junho, promovido pelo Centro para os Direitos Humanos e Ambiente (CEDHA) e ECO JURE. Está prevista a participação de Catarina de Albuquerque, relatora da ONU para o direito à água; Henri Smets, da French Water Academy; Peter H. Gleick, presidente do Pacific Institute for Studies in Development, Environment, and Security, de Oakland, California; e Aquilino Vazquez Garcia, presidente da Liga Mundial de Advogados Ambientalistas.
Os participantes vão debater a necessidade de mais pesquisas sobre questões de privatização, “especialmente por meio de estudos de caso de diferentes modelos de parcerias público-privadas. Um cuidado para a seleção de casos é que os estudos devem considerar as condições de controle governamental, particularmente em torno de questões de corrupção e capacidade de regulação do estado. O modelo de privatização pode ser influenciado por muitos fatores contextuais e estes precisam ser contabilizados nos estudos”, afirmam os promotores da mesa-redonda.

O que as empresas podem e devem fazer na prática, em respeito  ao direito humano à água e saneamento, é por sua vez o tema de debate que será realizado dia 17 de junho, pelo Global Compact da ONU, durante a extensa programação do Fórum de Sustentabilidade Corporativa Rio+20. O debate objetiva introduzir um quadro de aplicação dos Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos para a gestão da água.

No dia 18, no mesmo Fórum, Global Compact promove outro debate, em torno da premissa de que os riscos relacionados com a água ”são compartilhados entre empresas, governos, comunidades e meio ambiente, e que os processos equitativos através dos quais todas as partes envolvidas podem se unir e contribuir para mitigar esses riscos compartilhados são um poderoso instrumento de enfrentamento das emergentes questões da água deste século”. O debate seria então em torno do modelo de “partilha de risco, ação compartilhada”.
Outro encontro promovido pelo Global Compact, no mesmo dia de encerramento do Fórum, vai discutir ”como as empresas podem fazer uma contribuição positiva para a gestão sustentável da água em ambientes de alto risco operacional, onde as implicações de suas ações ou omissões são muito mais pronunciadas”. No encontro o CEO Water Mandate da ONU vai apresentar um novo quadro “para a compreensão da natureza dos desafios de água em áreas de conflito e alto risco e como estas afetam negócios”.

Entre os parceiros da organização do Fórum de Sustentabilidade Corporativa Rio+20 está a Alliance for Water Stewardship (AWS), que está construindo um “sistema internacional de gestão da água”, com o potencial de “criar uma mudança positiva e duradoura na maneira como a água é utilizada e gerenciada em todo o mundo”.
Está claro o grande envolvimento de vários setores relacionados à água na Rio+20, que pode entrar para a história se criar as condições para o início da construção de uma Convenção Internacional da Água, assim como já existem em mudanças climáticas, biodiversidade e desertificação. Tudo indica, assim, que a corrida mundial pela água dará um salto a partir da Cúpula da Terra.

É fundamental que o conjunto da comunidade internacional encontre soluções para a deterioração da água em escala global. Mais de 4 mil pessoas morrem por dia, em grande parte crianças, por doenças de veiculação hídrica, por falta de acesso a água potável e saneamento. O direito humano à água e ao saneamento veio muito tarde para essa multidão de vítimas fatais. Fonte: http://vidamais21.wordpress.com


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