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21 de outubro de 2008

CONGRESSO MUNDIAL DA ÁGUA ADOTA NOVOS PARADIGMAS

Os novos paradigmas no "Congresso Mundial da Água"

Do Fórum REBIA Nacional - Dr. Jorge Rios -21/10/08

De 8 a 12 de setembro de 2008, o CongressoMundial da Água, organizado pela IWA (International Water Association /Associação Internacional de Água) reuniu quase 3000 pessoas de 98 países em Viena.
A IWA é uma rede global de profissionaisde água, abrangendo pesquisae prática e cobrindo todos os aspectos dociclo de água.

No programa técnico do congresso, o assunto água foi discutido em conjunto com temas como mudança climática, crescimento populacional explosivo,crise global de saneamento, urbanização e biotecnologia. O evento teve como foco local a bacia do Rio Danúbio.
Numa exibição, companhias e organizações mostraram seus últimos produtos e serviços do setor da água.
O congresso aconteceu na capital da Áustria, num país pequeno, mas rico em água, no centro da Europa. A cidade deViena está banhada pelo Rio Danúbio. A bacia do Danúbio abrange 19 países, é a bacia mais internacionalizada, com 800mil km2, onde vivem 80 milhões de pessoas.

O rio tem uma vazão média de 2000 m3/s e 2780 km de comprimento. Existem algumas semelhanças com o Rio São Francisco que tem 2800 km de comprimento e uma vazão média de 2000m3/seg, chamado o rio de integraçãodo Brasil.

Atualmente, o Danúbio tem uma Comissão Internacional de Proteçãodo Danúbio, abrangendo 13 países.Mas a cidade de Viena não tem a sua água do rio como se imagina.Viena estava situada na divisa do Norte do ImpérioRomano que resolvia seus problemasde água com aquedutos e cisternas (Vitrúvio: Sobre a Arquitetura). Há 150 anos atrás, os responsáveis pela água da cidade fizeram uma decisão muito sábia: Não tiraram a água de Viena do Rio Danúbio, mas foram buscá-la nos Alpes atravésde duas adutoras e aquedutos. Aágua é transportada pela gravidade e gera energia em várias usinas. Nos Alpes esta água vem de uma área de captação e infiltração de chuva e neve derretida de 400 km2 que fornece até 400 mil m3 deágua por dia para a cidade.

Chafariz de água potável em Viena
Na cidade de Viena tem chafarizes -chamadas "colunas de água de beber" -para os transeuntes nas praças públicas tomar água ou abastecer sua garrafa de água de graça. A história de 2000 anosde abastecimento de água exemplar deViena nos devia dar sugestões para um bom planejamento de recursos hídricos a longo termo (Hans Sailer, Sobre a Estaçãode Abastecimento de Água de Viena).

Rio Danúbio

Estação de Tratamento de Esgoto em Viena
Mas também a estação de tratamento de esgoto é uma das mais modernas do mundo: o tratamento acontece de maneira física e biológica (dispensa o tratamento químico) e consegue retirar 95 % das impurezas antes de despejar água de qualidade no Rio Danúbio.
Nas cidades do Hemisfério Sul com crescimento populacional grande e ocupação irregular, até 80% vive em assentamentos não planejados, se possa preferir várias estações menores e descentralizadas.

Segundo o congresso a qualidade de água é um desafio cada vez maior (poluição, crescimento populacional) e não podemos deixar que a padrão de qualidade deteriore (como já aconteceu uma vez na Europa no século 18 e 19); mas foi falado também que na natureza não existe água 100 % limpa. Ate a água clorada não é e se torna estéril. A vida somente acontece em água que está "levemente poluída" (Helmut Kroiss, Presidentedo Programa Técnico do Congresso).

Um tema marcante foi a água e as mudanças climáticas: a Europa do Norte vai ter mais chuva, mas com maior irregularidade, e a Europa do Sul terá menos chuva num clima mais semi-árido. Mas a economia dos países industrializados vai se adaptar à mudança climática: O turismo do inverno na Áustria vai para regiões mais altas e a neve para esquiar se produz de maneira artificial.

A Austrália sente a escassez de água desde há pelo menos 40 mil anos quandoos seres humanos chegaram lá. Hoje sequer gerenciar a mudança climática com planos e estratégias integradas do ciclode água (rebalancear oferta e demandade água, economizar água {p. ex. em duchas, banheiros}, aproveitar água de chuva e uso de água reciclado) (Will Strachan,Sydney).

Centro de Convivência com o Deserto em LasVegas
Cidades em regiões de deserto como LasVegas nos Estados Unidos ensinam como economizar água e poder continuar crescendo. "A água nos hotéis da cidade transita em circuito fechado.
A cidade paga 90 milhões de dólares para os habitantes trocarem a grama irrigada por vegetação de deserto e ensina como uma cidade pode existir num Centro de Convivência com o Deserto (Desert Living Center)."Se você continua a regar a sua grama você deve pagar por isso." DissePatricia Mulroy, a gerente da Autoridade de Água do Nevada do Sul. " Todo dia está chegando pessoal para a nossa cidade.

Se eles querem viver num deserto,eles devem adaptar um estilo de vida de deserto. Por isso nós estamos criando a face do Novo Sudoeste seco dos EstadosUnidos, nós somos o povo mais feliz do mundo." Quem não pensa aqui na nossa"Convivência com o Semi-Árido", que deve incluir a vida de nossas cidades.
Mas até que ponto os países do Sul temos meios financeiros para lidar com a mudança climática? Os perdedores da mudança climática serão as áreas rurais nestes países, sobretudo na África. Será que o Semi-Árido Brasileiro pertence também a estas regiões?

A água de chuva é ainda uma "nova" fonte que deve ser mais aproveitada no futuro.
Tecnologias de captação de água de chuva, manejo melhorado do solo e agricultura/ silvicultura / criação de animais podem melhorar a segurança alimentar(Alexander Zehnder, Alberta Water Research Institute, Canadá).

Alguns dos organizadores da Oficina sobre Água da Chuva
Assim estamos chegando na área em que dei a minha colaboração principal: Durante o congresso, o Grupo de Especialistas em Captação e Manejo de Água de Chuva da IWA organizou uma oficina e apresentação de pôsteres sobre "Captação e Manejo de Água de Chuva para Adaptação à Mudança Climática".

As nove apresentações vieram dos seguintes países: Koreia (Captação de água de chuva na Cidade de Star, perto de Seoul), Estados Unidos (Estratégias descentralizadaspara se adaptar à mudança climática), Alemanha (Esfriando a temperaturade cidades, as chamadas ilhas de calor, com água de chuva; Captação de Água de Chuva para diminuir escoamento e aumentar a evaporação), Austrália(Captação de Água de Chuva e Educação),Indonésia (Captação de Água de Chuva na Recuperação de Áreas destruídas pelo Tsunami), Holanda (Manejo de Água de Chuva em Áreas Baixas da Holanda), Japão (Experiências novas de Captação de Água de Chuva) e Brasil (Captação de Água de Chuva para Adaptação à Mudança Climática no Semi Árido Brasileiro).

Uma organização semelhante à ASA - Articulação no Semi Árido, porém menor, existe em Sri Lanca (Community Network Project), onde NGOs implementam tecnologias de água de chuva para produção de verdura em canteiros, financiadas pelo governo.

Esfriando a temperatura de cidades e climatizar o interior de prédios (Alemanha)
Na discussão surgiram outras idéias interessantes: O "rastro de pé da água" está aumentando, quer dizer cada vez mais água está sendo transportada de cada vez mais longe (p. ex. através e canais e bombeamento) para chegar ao seu destino, aumentando assim o custo da água.
O rastro de água mais curto é a água da chuva, porque é captada e guardada no lugar onde é usada quando cai.
Tem uma tendência de captar a água de chuva pura em tanques, sem tratamento químico, somente com filtração (como já fizeram os romanos).

Água de chuva - da drenagem para o armazenamento
Quase como um manifesto surgiu uma estratégia da nova política de recursos hídricos de Seoul, Koreia, para promover a captação de água de chuva - Chegar da drenagem para o armazenamento e aplicar os quatro "Todo" (Mooyoung Han, Koreia):
- Capta-se toda a chuva
- Com todas as tecnologias possíveis
- Em todos os lugares
- Por todas as pessoas.
"Um tanque vazio é um bom tanque porque capta a próxima água de chuva que vem com certeza".

Formação de Novos e Jovens especialistas
Uma outra discussão promovida pelo congresso se referiu à formação dos novos e jovens especialistas em água. Ogrande desafio hoje é entre a engenharia e o meio ambiente: como deve ser a relação?
Os profissionais de água tradicionalmente se aprofundaram nas tecnologias, nas quais se tornaram especialistas (mas normalmente com uma visão estritamente tecnológica).
Agora os profissionaisestão ampliando sua visão, considerando água, tecnologias, meio ambiente e aspectoss ociais em conjunto.
Os futuros especialistas em água já tem ou deviam ter esta visão ampliada, mas devem se concentrar a partir da nova visão novamente no aprofundamento, porque os desafios são enormes.

O mesmo vale para as instituições que tratam do manejo da água. Na mesma discussão foi falado que os cientistas devem se preocupar não somente com um bom currículo dentro das instituições científicas, mas também ter capacidade de coordenação para ouvir e trabalhar junto com a sociedade para pôr em prática os projetos necessários para enfrentar a escassez de água, problemas de poluição ou mudança climática.
As decisões sobre água no futuro não devem ser feitas a partir de uma posição de poder, mas a partir de valores.
Assim o resultado não pode ser previsto, mas está sendo construído num processo social e político (Paul Brown, Processo político na implantação do Sistema de Tratamento de Esgoto em Los Angeles).

O desafio dos profissionais de água é ter uma visão em conjunto
A gente vê que mundialmente acontecem mudanças de paradigmas e de políticas:
No encerramento David Garman, o Presidenteda Associação Internacional da Água, apontou mais algumas:
- Devemos incluir no preço do uso da água os custos ambientais, sociais e financeiros;
- a água é um assunto além de adutoras, transposições e bombas;
- devemos aplicar estratégias descentralizadas e adaptá-las para a mudança climática;
- o esgoto não é lixo, mas é uma fonte (proteínas, fósforo, produção de algas para agro-diesel, etc.);
- precisamos de uma distribuição justa da água e garantir produção de alimentos para todos; devemos formar nossas cidades em direção à nova cultura da água.
O que se precisa é aumentar a resiliência (elasticidade): para que o mundo seja um barco que não afunda na tempestade da mudança climática. De um congresso de uma semana com dez acontecimentos ao mesmo tempo pode-se fazer somente um relatório pessoal e incompleto.

Mais de 20 % dos participantes eram mulheres.
A gente teria esperado uma participação maior da AméricaLatina (34 pessoas) e da África (54 pessoas). Uma participação ativa destes paises seria necessária para não deixar o tema água para a elite dos países desenvolvidos.
A falta de participantesdestes países aconteceu em parte, porque a taxa de inscrição era altíssima (Eu fico grato ao Governo Estadual daAlta Áustria pelo apoio financeiro).
Os contatos com especialistas de água do mundo todo, a partilha de experiências e a possibilidade de contribuir um pouco no processo político do gerenciamento de água no futuro fizeram a participação muito válida.

Fonte: João Gnadlinger - ABCMAC / ASA / Horizont3000 / IRPAA Juazeiro - BA, 30-09-2008
Fórum RÉBIA Nacional - Postagem do Prof. Dr. Jorge Rios - UFRJ

Um comentário:

  1. Agradeço que colocaram no seu blog o meu artigo sobre "Os novos paradigmas no Congresso Mundial da Água". O artigo com os retratos originais (que são diferentes do blog e se referem ao conteudo) se encontra em:
    www.abcmac.org.br/files/downloads/
    gnadlinger_congresso_mundial_da_agua_viena_2008.pdf
    Em breve vai ser publicado em revista científica.
    João Gnadlinger
    joao@irpaa.org
    johanng@abcmac.org.br

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