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3 de julho de 2014

NOVAS ARMAS NO COMBATE DA TEMIDA DENGUE QUE INFESTA O BRASIL

Dengue no alvo

Entre novas armas de combate à doença está um biossensor que faz diagnóstico da infecção por vírus em 20 minutos
DINORAH ERENO | Edição 220 - Junho de 2014

© MAURICIO PIERRO
Vacinas, insetos geneticamente modificados e armadilhas que funcionam como coletores de dados, além de um teste rápido de diagnóstico, são as estratégias que já estão sendo utilizadas ou estudadas para combater a dengue no Brasil e no mundo. Segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês), hoje cerca de 2,5 bilhões de pessoas, ou 40% da população mundial, vivem em áreas onde há risco de transmissão de dengue. As estimativas apontam que a doença atinge entre 50 milhões e 100 milhões de pessoas todos os anos, incluindo 500 mil casos de dengue hemorrágica e 22 mil mortes, principalmente entre crianças.
O Brasil é apontado como um dos 30 países mais endêmicos, entre os mais de 100 que registram a doença. Até abril deste ano, segundo o Ministério da Saúde, foram registrados 215 mil casos de dengue, uma redução de 70% em relação aos quatro primeiros meses do ano passado. “Como todas as doenças transmitidas por vetores, a incidência de dengue é espacialmente localizada, assim há aumento em algumas localidades e em outras há queda. Tudo depende do local onde se olha”, diz o infectologista Marcelo Burattini, professor de informática médica na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e de infectologia na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Os vetores são os mosquitos do gênero Aedes. Nas Américas, a espécie Aedes aegypti é a responsável pela transmissão da dengue. A circulação dos quatro sorotipos do vírus (1, 2, 3 e 4) transmitidos pelos mosquitos sofre constantes mudanças pelo mundo.
Como os sintomas da infecção pelo vírus são muito semelhantes aos de outras doenças, a detecção precoce faz toda a diferença para o paciente. Pensando nisso, pesquisadores do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP), coordenados pelo professor Francisco Eduardo Gontijo Guimarães, desenvolveram um teste diagnóstico que demora apenas 20 minutos para dar o resultado e pode ser acessado em tempo real pelo celular ou notebook. Para tentar reduzir o preço do produto final e concorrer com o teste importado, utilizado apenas em casos que demandam confirmação, como dengue grave ou complicada e para fins de vigilância epidemiológica, eles recorreram à interação antígeno-anticorpo para detectar o vírus da dengue. Esse vírus secreta na corrente sanguínea uma proteína estrutural, chamada de NS1, logo nos primeiros dias de infecção. Já o corpo humano produz anticorpos específicos que combatem a NS1 após o quinto dia de infecção. “A grande novidade do projeto foi a produção dos anticorpos em grande concentração em ovos de galinha”, diz Guimarães. Esses anticorpos são posteriormente imobilizados sobre uma membrana metálica (biossensor) que, em contato com o sangue infectado, reage com a proteína NS1, produzindo um sinal elétrico. “Apesar de o corpo ter milhões de proteínas, só aquela gerada pelo vírus da dengue se liga ao anticorpo.”
Atualmente, o exame mais utilizado em postos de saúde para detectar a doença só pode ser feito a partir do sexto dia, o que faz ela ser confundida com outras infecções e nem sempre ser tratada da forma adequada. “O teste convencional não pode ser feito nos primeiros dias porque ele mede a concentração de anticorpos, presentes a partir do sexto dia”, ressalta. Já o biossensor em testes avalia uma pequena concentração da proteína NS1, que é produzida pelo vírus assim que ele entra na corrente sanguínea da pessoa infectada. Em setembro do ano passado, a USP fez um depósito de patente da inovação.
O projeto foi desenvolvido no âmbito do Instituto Nacional de Eletrônica Orgânica, um dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) com sede no Instituto de Física de São Carlos da USP, financiado pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). “Nós já trabalhávamos com biossensores quando, há três anos, tivemos a ideia de desenvolver um aparelho portátil e de baixo custo para detecção da dengue”, diz Guimarães. A ideia é que todo posto de saúde, mesmo em lugares remotos, possa fazer o teste sem que o sangue tenha de ser levado para grandes centros. O projeto está em fase final de execução.
Uma outra linha de pesquisa trabalha com uma tática inovadora, cujo objetivo é bloquear o vírus da dengue em Aedes aegypti utilizando a bactéria Wolbachia. Essa bactéria simbiótica encontra-se presente nas células de cerca de 70% de todas as espécies de insetos, como moscas-das-frutas, pernilongos e borboletas. O projeto, iniciado em 2006 e coordenado pelo professor Scott O’Neill, da Universidade Monash em Melbourne, na Austrália, envolve ainda pesquisadores de outros seis países, entre os quais o Brasil. Aqui os estudos são conduzidos na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, sob a coordenação de Luciano Moreira e a participação de 15 pesquisadores.

A bactéria é retirada de moscas-das-frutas e introduzida em ovos do Aedes. Após a criação de colônias de mosquitos em laboratório, elas são liberadas na natureza. Além de bloquear a transmissão do vírus da dengue pelo mosquito, a bactéria atua na sua reprodução. Estudo publicado em 25 de agosto de 2011 na revistaNature divulgou os resultados de um teste experimental em campo feito em duas localidades da cidade de Cairns, em Queensland, durante 10 semanas. Foram liberados 300 mil Aedes adultos com aWolbachia e, após cinco semanas, em uma das localidades 100% dos mosquitos selvagens carregavam a bactéria e na outra 90%, portanto eles eram incapazes de transmitir o vírus. Testes de campo estão sendo feitos no Vietnã e na Indonésia e a previsão é que ainda este ano eles comecem também no Brasil, após a aprovação das instâncias regulatórias.

Na mesma linha, mas com outra abordagem, estão os mosquitos geneticamente modificados criados em 2002 pela empresa britânica Oxford Insect Tecnologies (Oxitec), que foram liberados em abril deste ano pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) para uso comercial. No entanto, sua produção depende ainda de registro comercial no Ministério da Saúde com base na análise técnica da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os mosquitos carregam um gene letal para a prole, que morre antes de chegar à fase adulta. O método consiste em liberar um grande número de machos geneticamente modificados em áreas onde há infestação – os machos não picam e, portanto, não transmitem a dengue. Ao copularem com as fêmeas selvagens, são gerados descendentes que morrem ainda nos primeiros estágios de desenvolvimento (ver mais sobre o assunto na edição nº 180 de Pesquisa FAPESP). No Brasil, os parceiros da Oxitec têm sido o Instituto de Ciências Biomédicas da USP, responsável pelos testes em laboratório com a linhagem transgênica, e a organização social Moscamed, que cuida dos testes em campo e tem uma biofábrica para a produção dos mosquitos em Juazeiro, na Bahia. “Desde 2002 estamos fazendo testes e ensaios com essas linhagens, inclusive no Brasil”, diz Glen Slade, diretor global de desenvolvimento de negócios da Oxitec.
As prefeituras serão os principais clientes para a compra dos mosquitos transgênicos. “Ainda não temos informação fechada sobre custos, mas temos estudos para uma área com 50 mil pessoas”, relata Slade. O primeiro ano, que é considerado de soltura intensiva para que haja uma redução na quantidade de Aedes adultos selvagens, custará entre R$ 2 milhões e R$ 5 milhões. O segundo ano, chamado de manutenção, ficará em até R$ 1 milhão. “Existe ainda a opção de fazer parcerias com os municípios para treinar pessoas para o programa de manutenção, o que irá reduzir o valor da solução”, diz. Durante quatro a seis meses da fase intensiva é preciso soltar entre 100 e 200 mosquitos por semana por pessoa. A Oxitec está começando a produzir os primeiros mosquitos em gaiolas em uma fábrica própria instalada em Campinas, com capacidade para produção de 2 milhões de mosquitos transgênicos por semana. É uma produção pequena, que dá para tratar uma área com 10 mil pessoas. A intenção é criar outras fábricas mais próximas dos projetos futuros.
As vacinas são outra frente bastante promissora de combate à doença, mas ainda não há nenhuma delas no mercado. A mais adiantada entre todas as que estão em desenvolvimento é a do laboratório Sanofi Pasteur, que está na fase 3 de desenvolvimento clínico, com testes em larga escala para avaliar a sua eficácia. Resultados preliminares divulgados em abril deste ano pelo laboratório demonstraram 56% de redução de casos de dengue em um estudo feito entre 2011 e 2013 com mais de 10 mil voluntários na Ásia. Participaram crianças com idades entre dois e 14 anos em áreas endêmicas para dengue da Indonésia, Malásia, Filipinas, Tailândia e Vietnã. Os participantes receberam três injeções da vacina ou um placebo com intervalos de seis meses entre cada dose. “As crianças foram escolhidas porque são elas que apresentam os casos mais graves da doença”, relata a médica Sheila Homsani, gerente do departamento médico da Sanofi Pasteur.
Ainda não foram fechados os estudos que irão mostrar se a imunização é eficaz contra os quatro sorotipos do vírus. “Os resultados preliminares da Ásia serão complementados no segundo semestre deste ano com os dados de um segundo estudo que está sendo realizado na América Latina e conta com mais de 20 mil voluntários, de nove a 16 anos, do Brasil, Colômbia, Honduras, México e Porto Rico”, diz a médica. A análise da eficácia será feita por sorotipo. Em relação às críticas feitas por infectologistas e imunologistas ao estudo feito na Tailândia em 2012, em que foi relatado que a vacina não protegia contra o sorotipo 2, Sheila diz que ainda era um estágio precoce de desenvolvimento. “Foram avaliadas apenas 4 mil pessoas e numa única região”, diz. “O estudo divulgado recentemente foi feito em diferentes ambientes epidemiológicos da Ásia, assim como na América Latina.”
A divulgação dos 56% de eficácia da vacina também foi questionada por alguns especialistas. A hipótese aventada pelos críticos é que, se não houver proteção total contra todos os sorotipos e se a pessoa vacinada for infectada novamente, aumentaria o risco de contrair a dengue hemorrágica. “Esse risco é teórico e não foi observado nos ensaios feitos até agora”, diz Sheila. “Temos pacientes vacinados desde o início do estudo e o bom perfil de segurança da vacina se manteve conforme estudos prévios.”
A vacina é feita com o vírus atenuado e recombinante. “Parte do envelope dos quatro sorotipos do vírus da dengue é atenuado e por dentro é recheado com o vírus vacinal da febre amarela, que é estável em termos de eficácia e segurança”, explica a médica. As pesquisas que resultaram na vacina tiveram início há 20 anos. A previsão é que até o final de 2015 ela esteja disponível no Brasil.
Além da Sanofi, outros grupos de pesquisa brasileiros, como o Instituto Butantan, em São Paulo, e o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos da Fundação Oswaldo Cruz (Bio-Manguinhos/Fiocruz), do Rio de Janeiro, estão trabalhando no desenvolvimento de vacinas tetravalentes para a dengue. A do Butantan, cujas pesquisas começaram em 2005, tem como parceiro os Institutos Nacionais de Saúde (NIH) dos Estados Unidos. A tecnologia é a de vírus vivo atenuado através de modificação genética de vírus selvagens. O agente infeccioso permanece capaz de estimular a produção de resposta de defesa do organismo, mas não de causar a doença. Diversos estudos de fase 1 com seres humanos foram realizados nos Estados Unidos para selecionar os quatro vírus atenuados que compõem a vacina e provar a segurança e a resposta imune gerada pela combinação dos quatro vírus. A fase 2 do estudo, primeira dos testes clínicos em humanos no Brasil que têm como finalidade avaliar a segurança e a imunogenicidade (capacidade de induzir resposta imunológica) da vacina tetravalente, começou em outubro do ano passado. Até o início de junho haviam sido vacinados 50 voluntários, com idade entre 18 e 59 anos, que nunca tiveram dengue. A vacina demonstrou ser segura nesse grupo. Em uma segunda etapa serão recrutados mais 250 voluntários com ou sem infecção prévia pelo vírus. Os resultados desse estudo devem ser conhecidos em meados de 2015 e, se forem favoráveis, um estudo de fase 2 com milhares de participantes deverá avaliar a eficácia da vacina.
A de Bio-Manguinhos é feita em colaboração com o laboratório britânico GlaxoSmithKline (GSK) desde 2009, quando firmaram um acordo de pesquisa e desenvolvimento para a obtenção de uma vacina inativada tetravalente para a dengue. Após testes em camundongos, em 2013 foram feitos testes em macacos, como parte dos estudos pré-clínicos. A próxima etapa será o início dos testes clínicos em humanos, prevista para ocorrer no ano que vem. Estudos epidemiológicos para a definição de locais para a avaliação da vacina já foram feitos em Fortaleza, Rio de Janeiro, Salvador e Manaus. Paralelamente, outra parceria da Fiocruz com a GSK – esta envolvendo também o Walter Reed Army Institute of Research, do exército dos Estados Unidos – já está testando uma vacina de dengue em adultos no Caribe e Estados Unidos.

Para o infectologista Burattini, as vacinas são, em uma perspectiva futura, o método mais eficaz de combate às epidemias de dengue. Ele, no entanto, ressalva que nenhuma das vacinas desenvolvidas até agora é 100% eficaz. “Como elas demandam um esquema posológico de duas a três doses, o que limita muito a eficácia real da vacina, e há um intervalo grande de tempo para a repetição das doses, é difícil saber se elas vão funcionar na prática”, diz Burattini, coordenador de uma pesquisa encomendada pelo Ministério da Saúde, prevista para terminar no final do ano, que tem como objetivo estabelecer a melhor estratégia de vacinação para a dengue.

Na sua avaliação é importante estudar e diferenciar a eficácia da vacina de sua efetividade em condições de uso na saúde pública. “A eficácia depende da sua capacidade de suscitar uma resposta imune protetora e duradoura contra os quatro sorotipos do vírus, já a efetividade real depende também de uma série de fatores relacionados às condições operacionais e às características das populações onde as vacinas forem utilizadas”, ressalta. Outro aspecto abordado é que, na sua avaliação, a vacina ideal deveria ser aplicada em uma única dose ou com o menor intervalo de tempo entre uma dose e a próxima. E o terceiro é que ela deve ser isenta de efeitos adversos duradouros. “A vacina precisa mostrar, em ensaios clínicos, que os antígenos que ela usa não estarão relacionados a efeitos adversos, como a propensão a formas graves da doença se houver reinfecção com outro sorotipo, devido a uma exacerbada resposta inflamatória.”
Uma das formas de controle de insetos adultos em uso atualmente por 10 cidades brasileiras, entre elas Santos, Vitória, Porto Alegre e Uberaba, todas com mais de 300 mil habitantes, é um sistema de informação chamado monitoramento inteligente da dengue (MI- Dengue), desenvolvido em parceria entre a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a empresa Ecovec, de Belo Horizonte. “É uma plataforma que utiliza armadilhas para a captura de Aedes adultos como coletor de dados, que tem como grande vantagem a possibilidade de se ter fotografias semanais da população do vetor por cada quarteirão da cidade”, explica Gustavo Mamão, diretor da empresa.
Criada pelo professor Álvaro Eiras, da UFMG, a armadilha Mosquitrap imita um criadouro para as fêmeas adultas do Aedes. No momento em que elas entram nos cilindros pretos de plástico para depositar seus ovos, atraídas por um composto químico, acabam presas a um cartão adesivo (ver mais na edição nº 142 de Pesquisa FAPESP). Os dados coletados são enviados pelo agente de campo da prefeitura através de um telefone celular para a plataforma central do MI-Dengue, que tem dentre as suas funcionalidades a geração de mapas do município com manchas coloridas que trazem indicativos de infestação do vetor. Santos, no litoral de São Paulo, utiliza o MI-Dengue desde 2012. “Estão espalhadas pela cidade 461 armadilhas vistoriadas por seis agentes e um supervisor”, diz Mamão. A partir de julho, o projeto será aplicado, experimentalmente, em um condado da Flórida, nos Estados Unidos, durante seis meses. Desde que o sistema foi criado, 50 cidades brasileiras já testaram a plataforma, além de países como Austrália, Cingapura e Colômbia.
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