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19 de fevereiro de 2009

DESMATAMENTO NA AMAZÔNIA ESTÁ ALTERANDO TERRA E CÉU


Imagem de satélite mostra que perda de vegetação muda tipo de distribuição de vapor nos céus da floresta; pesquisa uniu Brasil e EUA (Rafael Garcia/Folha Imagem)

Desmate faz nuvem "seca" proliferar na Amazônia

Estudo ajuda a explicar como alterações na terra afetam o regime de chuvas


Trilha de nuvens cobre o rio Amazonas em Monte Alegre (PA)

AFRA BALAZINA - 18/02/2009


Um estudo que monitorou os tipos de nuvens que cobrem a floresta amazônica mostra que o desmatamento parece estar causando tanto alterações na terra quanto no céu. Usando imagens de satélites e dados obtidos por balões meteorológicos, cientistas brasileiros e norte-americanos comprovaram a teoria de que a derrubada de árvores favorece a formação de nuvens "rasas", em contraposição a nuvens "profundas", mais chuvosas.

A conclusão ocorreu após análise de imagens e informações de Rondônia. O novo estudo ajuda a explicar por que o desmatamento faz a floresta ficar mais seca e corrobora com os estudos que preveem a conversão da Amazônia em savana.

"No momento em que temos uma floresta que retém bastante água, temos um ciclo da água, um ciclo de energia. Quando retiramos a floresta e a cobertura vegetal, mudamos esse ciclo. Certamente vai se criar outro cenário climático na região", afirma o meteorologista Luiz Augusto Machado, um dos autores do estudo. Ele é pesquisador do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

O trabalho foi publicado ontem na revista "PNAS", da Academia Nacional de Ciências dos EUA. O climatologista do Inpe Carlos Nobre, que não participou da pesquisa, diz que "uma generalização destes resultados vai na direção de apoiar a hipótese de savanização". Mesmo não sendo possível afirmar ainda que isso vale para toda a Amazônia, Nobre diz que os resultados "são fisicamente consistentes e indicam que as chuvas poderiam diminuir com o aumento do desmatamento".
Segundo Machado, a brasileira Elen Cutrim foi, em 1995, uma das primeiras a descrever esse fato de forma empírica e artesanal. "Agora, comprovamos com uma longa série de dados o estudo dela", disse.

Rafael Bras, da Universidade da Califórnia em Irvine, coautor do estudo, explicou o fenômeno em e-mail para a Folha. Segundo ele, nuvens rasas sobre desmatamentos ocorrem por mudanças na convecção, o movimento de massa de ar por diferença de calor -mesmo princípio físico que faz um balão de ar quente subir.

Oceano verde

"Se a região de desmatamento aumentar, a intensidade desta circulação pode diminuir e, mais importante, ficar mais seca e limitar o desenvolvimento de precipitação sobre a floresta", diz Bras. "No artigo, nós chamamos isso de "efeito do oceano verde".
Para ele, a floresta funciona como um oceano fornecendo vapor d'água para alimentar nuvens profundas. "Se o "oceano" desaparecer, o vapor d'água, a energia e a precipitação também desaparecem", diz.

Jingfeng Wang, coautor do estudo ligado ao MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), diz que o tamanho e forma da terra desmatada influenciam na possibilidade de recuperação da floresta. "O que não sabemos é quanto desmatamento é demais para que o "oceano verde" entre em colapso e suma para sempre", diz.

Enio Pereira de Souza, professor da Universidade Federal de Campina Grande, diz que o estudo confirma resultados de pesquisa que ele realizou há dez anos. Ele é ex-colaborador de Nilton Rennó, da Universidade do Arizona, um dos autores do estudo na "PNAS".

Souza conta que, na época, os estudos que indicavam o aumento das nuvens rasas sobre regiões desmatadas não eram muito aceitos por falta de provas. Segundo ele, sempre se deu mais importância às nuvens profundas. Mas agora, diz, o mapeamento das nuvens rasas se tornou "central na compreensão de todo esse mecanismo ligado à troca de energia entre a superfície e a atmosfera e como isso se relaciona com o clima global e eventos extremos de precipitação".

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