Em azul escuro a área que permanecerá alagada. A Barragem Principal diminuirá a vazão da chamada 'Volta Grande', desviando a maior parte para um reservatório menor pelos canais de derivação. Na Volta Grande será garantida uma vazão mínima equivalennte ao período seco natural. Fonte: Jornal O Liberal 03/02/2010 |
Eu não assino petições contra Belo Monte
Ontem pela manhã recebi um e-mail me convocando para assinar uma petição contra a construção da Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, próxima à cidade de Altamira, Pará. Uma das obras mais importantes e caras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Belo Monte vem sendo alvo da oposição de ambientalistas, além da de muitos economistas liberais.
Ontem mesmo no Twitter, um colega chegou a insinuar que sou suspeito para falar sobre o tema, na medida em que me anuncio eleitor do governo que propõe a obra. Lamentou que minhas "preferências políticas (transitórias), estão acima das questões realmente importantes (permanentes)". Calejado aqui no blog pelo debate da Transposição do Rio São Francisco, sigo com minhas tecladas contra o que eu costumo chamar de "ambientalismo santuarista".
Instigado por outros twitteiros resolvi transformar a resposta que dei àquele e-mail, num post mais ou menos organizado, se é que eu consigo organizar alguma coisa mentalmente. Vou me fixar em alguns pontos tratados como verdadeiros escândalos pelos que se opõem ao projeto. Tamanha indignação com determinadas inverdades, na minha modesta avaliação, acabam por desqualificar o que poderia ser uma reivindicação mais consistente.
Não estou aqui para negar impactos sócio-ambientais de Belo Monte, mas tentando pôr na balança os diferentes aspectos da obra.
Afirma a petição:
Ontem pela manhã recebi um e-mail me convocando para assinar uma petição contra a construção da Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, próxima à cidade de Altamira, Pará. Uma das obras mais importantes e caras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Belo Monte vem sendo alvo da oposição de ambientalistas, além da de muitos economistas liberais.
Ontem mesmo no Twitter, um colega chegou a insinuar que sou suspeito para falar sobre o tema, na medida em que me anuncio eleitor do governo que propõe a obra. Lamentou que minhas "preferências políticas (transitórias), estão acima das questões realmente importantes (permanentes)". Calejado aqui no blog pelo debate da Transposição do Rio São Francisco, sigo com minhas tecladas contra o que eu costumo chamar de "ambientalismo santuarista".
Instigado por outros twitteiros resolvi transformar a resposta que dei àquele e-mail, num post mais ou menos organizado, se é que eu consigo organizar alguma coisa mentalmente. Vou me fixar em alguns pontos tratados como verdadeiros escândalos pelos que se opõem ao projeto. Tamanha indignação com determinadas inverdades, na minha modesta avaliação, acabam por desqualificar o que poderia ser uma reivindicação mais consistente.
Não estou aqui para negar impactos sócio-ambientais de Belo Monte, mas tentando pôr na balança os diferentes aspectos da obra.
Afirma a petição:
"A mega usina de Belo Monte iria cavar um buraco maior que o Canal do Panamá no coração da Amazônia, alagando uma área imensa de floresta e expulsando milhares de indígenas da região. As empresas que irão lucrar com a barragem estão tentando atropelar as leis ambientais para começar as obras em poucas semanas."
É fato que a obra irá "cavar" dois canais de derivação que desviarão a água do rio, desde a primeira barragem, até a barragem próxima às principais casas de força, mas não é verdade que serão expulsos milhares de indígenas. Suas terras não serão alagadas e o principal impacto será a diminuição da vazão da chamada 'Volta Grande' (ver na imagem em azul claro), trecho do rio que terá suas águas desviadas. Curiosamente esse aspecto é pouco citado pelos ambientalistas e para ela eu teria algumas sugestões que não cabem nesse post.
As empresas e o governo não estão "atropelando leis ambientais", mas pedindo para que não se exija que as condicionantes impostas pelo Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) sejam totalmente cumpridas antes do início dos trabalhos da usina propriamente dita. Para assinar o contrato de financiamento do BNDES, elas precisam da Licença de Instalação – autorização para o início da construção - , mas para obter essa licença é exigido o cumprimento dessas contrapartidas, que de alguma forma serão custeadas pelo empréstimo do banco. Um nó. Já vivemos esse dilema nas usinas do Madeira e a solução encontrada pelo governo foi a emissão de uma licença provisória (fragmentada), artifício, no entanto, contestado pelo Ministério Público.
No fundo, são argumentos protelatórios, numa tática de guerrilha tentando vencer pelo cansaço. As contrapartidas terão que ser realizadas de qualquer forma e não há nada de anormal que as empresas tenham mais tempo para cumpri-las.
"A hidrelétrica iria inundar 100.000 hectares da floresta".
Essa usina é a fio d'água, com barragem pequena. Os dois lagos principais, inundarão algo como 500 km2, metade deles já em área ocupada pelo rio em períodos de cheia, sem florestas. A outra metade, cerca de 260 km2, nem é totalmente formada por florestas, pois há campos e pastagens já formados, o que torna o impacto ambiental bem menor. Essa área representa, só para contextualizar, 1/10 do que foi reduzido no desmatamento da Amazônia de 2009 para 2010.
Para termos de comparação, a usina de Balbina, no estado do Amazonas, produz 250 MW com uma área alagada de 3.000 km2. Tucuruí, no Pará, inunda 2.850 km2 e tem uma capacidade instalada de 8.340MW.
"Vai expulsar mais de 40.000 pessoas, incluindo comunidades indígenas de várias etnias que dependem do Xingu para sua sobrevivência."
Em relação ao remanejamento de pessoas, Belo Monte vai deslocar algumas centenas de moradores vinculados à atividades agrícolas e cerca de duas mil famílias em Altamira, que vivem atualmente em situação precária. Suas casas, palafitas na maioria das vezes, durante o período em que o rio está cheio, ficam com água sob o piso, e, quando o rio seca, com lama, onde as crianças brincam e fazem suas necessidades – relato de moradores.
Já os pouco mais de 500 índios, que moram a jusante da barragem principal (na Volta Grande, em azul claro na imagem), onde o volume de água diminuirá no período de chuva, poderão ser realocados em nova aldeia, vizinha aos canais ou ao próprio reservatório principal. Os estudos de impacto buscam é saber o que é fundamental para essas pessoas viverem, manterem suas atividades, e de que forma se pode diminuir ou compensar o impacto. Os habitantes das terras indígenas que estão próximas ao empreendimento - Paquiçamba, Arara da Volta Grande, Trincheira Bacajá e Juruna - sofrerão mudanças em seu modo de vida, mas repito, não terão suas terras alagadas.
O Brasil já tem histórico de como atuar sobre essa população. Por exemplo, como o que foi feito com os Waimiri-Atroari, durante a construção de Balbina, em plena ditadura. Os Waimiri-Atroari, fortemente afetados pela construção da BR-174, cujo trajeto rasgou ao meio sua área geocultural, e pelas minas de cassiterita do Grupo Paranapanema, eram uma nação em extinção, com pouco mais de 300 índios doentes. Hoje segundo dados do próprio Programa Waimiri-Atroari, há uma crescente população de mais de 1.300 indivíduos. Um projeto que lideranças do mundo todo vem conhecer, e os brasileiros não conhecem.
O projeto de R$30 bilhões é tão economicamente arriscado que o governo precisou participar com estatais e usar fundos de pensão e financiamento público para pagar a maior parte do investimento.
Se fosse tão arriscado, o leilão não teria oferecido energia a R$ 77,00. Fundos de Pensão participam de quase todas as obras de infraestrutura do mundo, são investidores como outro qualquer. Obras desse pote atraem justamente quem tem poupança e procura diversificar suas carteiras. PT saudações. Por outro lado, para que serve mesmo o Estado senão para fazer aquilo que não interessa à iniciativa privada? Eu não ajudei a eleger Dilma Rousseff para ela vincular um projeto estruturante ao humor do mercado. Foi dessa forma que chegamos ao apagão de 2001. Acho que seria mais apropriado dizer que o projeto é tão pouco arriscado, que atraiu mais de 50% do capital privado.
"Apesar de ser a terceira maior hidrelétrica do mundo, ela seria a menos produtiva, gerando apenas 10% da sua capacidade no período da seca, de julho a outubro."
Primeiramente, o que conta, o que está em jogo nos cálculos econômicos, é a média anual de produção e o fato de que seu pico (11.000 MW), assim como Tucuruí, permitirá que o sistema integrado nacional, preserve água nas barragens de outras regiões. De janeiro a maio ela deve gerar energia em plena capacidade. Ou seja, a energia entra no sistema e é distribuída para o País como um todo. Enquanto isso, as hidrelétricas do Sudeste e Nordeste estarão acumulando água nos reservatórios. Quando chegar a época de seca, Belo Monte irá gerar muito menos energia e outras hidrelétricas estarão atendendo a região Norte. O Sistema Brasileiro é todo interligado e não faz sentido o argumento de que essa energia vai para esse ou outro conglomerado econômico.
Além disso, considero esse argumento um tanto quanto "pouco honesto". Vai produzir 10% no período seco, já que será uma usina a fio d'água, sem reservatório para regularizar o rio e armazenar recursos hídricos para o período seco. Traduzindo, Belo Monte vai produzir energia praticamente com o que a natureza mandar de água a cada dia. Belo Monte não terá poupança de água.
E porque ela será construída a fio d'água? No debate sócio-ambiental os ministérios de Minas e Energia e Meio Ambiente acordaram construí-la sem reservatório. O acordo definiu também que Belo Monte será o único aproveitamento hidrelétrico do rio Xingu. O projeto original previa até 3 outros reservatórios, mais ou menos como é o complexo de Sobradinho-Luiz Gonzaga-Xingó-Paulo Afonso, que com o São Francisco plenamente regularizado garante água o ano todo.
Ou seja, como a NÂO regularização do rio Xingu foi uma conquista do movimento sócio-ambiental e aceita pelo governo, vamos combinar que esse argumento é no mínimo questionável. Não queriam a obra e só fizeram o acordo como mais uma manobra protelatória? Não participaram do acordo?
Debate necessário e urgente
O Brasil passou 30 anos sem investir em energia. Duas décadas de baixo crescimento permitiram que a leniência só fosse percebida no apagão de 2001. Quando o Estado voltou a dar prioridade ao setor, voltamos ao dilema mais ou menos já debatido nos anos 1970/80: "qual é o modelo, a matriz mais adequada?"
Solar; eólica; térmicas a gás; termonuclear; PCHs (pequenas hidrelétricas); hidrelétrica com grandes reservatórios; hidrelétrica a fio d'água; todas elas juntas; alguma dessas alternativas não serve?
Esse é um debate legítimo e cada vez mais atual, pois insere questionamentos sócio-ambientais e econômicos. (Leia também: Hermes Chipp: A tendência é gerar mais térmicas)
Eu acredito que a resposta é "todas elas", porque temos vocação para todas, porque quanto mais fontes, mais segurança energética teremos e porque temos uma renda média baixa e não podemos nos dar ao luxo de desprezar energias baratas.
Belo Monte faz parte desse "mix" de oferta e é um modelo para as hidrelétricas de seu porte e com pouca área alagada. Que envolve danos sócio-ambientais é óbvio, mas em alguma medida qualquer fonte energética pede seu preço. Produzir uma média segura de 4.000 MW durante o ano, com picos de 11.000 MW, é complexo para qualquer matriz, mesmo as aparentemente mais brandas.
Pra twittar:
"Eu não assino petições contra Belo Monte". http://bit.ly/fSuco1 (via @aleportoblog).
FONTE: ALEXANDRE PORTO - BLOG DO ALE
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