Seguidores do Blog SOS Rios do Brasil

5 de junho de 2009

PORTAL DO MEIO AMBIENTE, DO VILMAR BERNA, NO DIA DO MEIO AMBIENTE



Até quando a natureza vai suportar? - Entrevista com Aristides Arthur Soffiati

Da luta em defesa do Meio Ambiente há mais de 30 anos, o doutor em História Social Aristides Arthur Soffiati tem acompanhado várias ações do homem provocarem danos sucessivos à natureza

Liliane Barreto - Sex, 05/Jun/2009

Militante da luta em defesa do Meio Ambiente há mais de 30 anos, o doutor em História Social Aristides Arthur Soffiati tem acompanhado várias ações do homem provocarem danos sucessivos à natureza. Ele afirma que o mais grave acidente ocorrido no Rio Paraíba do Sul foi causado pelo derramamento de Endosulfan, pela empresa de produtos químicos, Servatis, em Resende, no Sul Fluminense. Soffiati alega que, apesar da preocupação pela Bacia do Paraíba do Sul, manifestada pelos governos federal, estaduais e municipais, as autoridades não partem para ações efetivas e integradas. Ele alega que a Bacia do Paraíba do Sul não comporta mais barragens e que, da década de 50 para cá, estima-se que o Rio Paraíba do Sul tenha perdido cerca de 45% de sua capacidade de enfrentar o mar. Apesar disso, uma barragem está em andamento e mais três estão previstas. Para ele, elas representarão um desastre para o rio e sua Bacia. Outra preocupação do ambientalista se refere aos impactos que os grandes empreendimentos previstos para a região poderão causar socioambientalmente quando estiverem em atividade.

Monitor Campista - O Rio Paraíba do Sul vem sofrendo as consequências de sucessivos acidentes ambientais. Quais são os impactos, hoje, na natureza diante deste quadro?

Aristides Sofiatti - Não apenas o Rio Paraíba do Sul vem sofrendo danos à saúde dos ecossistemas, mas também toda a sua Bacia. É oportuno lembrar que, desde 1982, os principais acidentes que afetam o rio vêm pelos seus afluentes, sobretudo, pelos rios Paraibuna, Pomba e Muriaé. O mais grave foi o causado pelo derramamento de Endosulfan, em Resende, este sim, inteiramente dentro do Paraíba do Sul. Os outros foram graves, como o derramamento de metais pesados pela Paraibuna Metais, em 1982, por lixívia negra, pela Cataguases Celulose, e por bauxita com barro, em Miraí. Todos eles foram graves, mas atingiram os rios da Bacia de forma crônica, ou seja, de maneira aparentemente branda, pois que seus efeitos se fazem em longo prazo. O Endosulfan, por outro lado, é um veneno que causa efeitos imediatos, envenenando flora e fauna e provocando sua morte, inclusive, quando chegou ao mar. Considerando ainda a poluição crônica da Bacia por despejo de esgoto, os acidentes criam situações agudas que só agravam o estado de equilíbrio ambiental da Bacia.

A região já conseguiu se recuperar?

Embora os efeitos imediatos dos acidentes passem, é preciso considerar que todos eles deixam marcas na Bacia. O leito dos rios da Bacia funciona como um registro. Se alguém quiser saber a história desses acidentes, basta colher sedimentos no fundo do rio e estudá-los. Tudo esta lá, inclusive, o derramamento diário de esgoto. Como se trata de um processo lento de degradação, não notamos pioras, mas elas estão em andamento. Em suma, os rios da Bacia não conseguiram se recuperar a ponto de restabelecerem equilíbrios ecológicos.

O que tem sido feito?

A bem-dizer, nada. Os governos federal, estaduais e municipais manifestam grande preocupação pela Bacia do Paraíba do Sul, mas não partem para ações efetivas e integradas com entes federados interessados. É bem verdade que já existe um comitê para a Bacia como um todo, que é o Ceivap, e uma Agência de Bacia, a Agevap. Para a parte final da Bacia, foi criado recentemente o Comitê do Baixo Paraíba, correspondente à Região Hidrográfica IX. Mas, por enquanto, não passamos dos discursos e das intenções.

Qual é a sua opinião sobre a ação indenizatória condenando as empresas responsáveis pelo acidente de Cataguases, em 2003?

Ela era necessária. Não se pode mais tolerar irresponsabilidades criminosas por parte de empresas e municípios ao longo dos rios da Bacia. Mas precisamos ir além. Precisamos formular um plano integrado de restauração e revitalização da bacia. Isto custa caro, mas os ganhos futuros compensam o investimento.

Este ano, a região de Lagoa de Cima e Ururaí sofreram muito com as cheias, inclusive, da Lagoa Feia. Na ocasião, as constantes chuvas na região serrana do município influenciaram. Qual é a sua avaliação do cenário existente hoje naquela região?

As cheias que atingiram a bacia da Lagoa Feia, incluindo nela os rios Imbé, Urubu, Preto, Ururaí e Macabu e ainda a Lagoa de Cima, resultaram de um acúmulo secular de erros ou de exploração predatória da natureza. Em primeiro lugar, as chuvas parecem ter aumentado de volume nos últimos quatro anos, fenômeno que, a meu ver, deriva já das mudanças climáticas globais. Estas chuvas caíram na Serra do Mar, conhecida como Imbé entre nós. Como a área está muito desmatada, as águas não foram devidamente retidas e correram por vários rios serranos para o vale do Rio Imbé, já bastante assoreado. Ao chegarem na Lagoa de Cima, encontraram um ambiente com aterros, assoreado e com suas margens ocupadas indevidamente. Daí fluíram pelo Rio Ururaí, onde existem vários estrangulamentos, sendo o principal na localidade de Ururaí. A ponte da BR-101, nesta localidade, está subdimensionada e existe, dentro do leito maior do rio, uma ocupação completamente irregular de casas de pessoas de baixa renda. Mais adiante, a Estrada dos Ceramistas representou uma verdadeira barragem ao escoamento das águas. O trecho final do Ururaí foi retilinizado pelo extinto Departamento Nacional de Obras e Saneamento [DNOS]. Quase no final, as águas entram na Lagoa Feia, que passou de 370 quilômetros quadrados, em 1898, para 170 quilômetros quadrados, na atualidade. O Canal das Flechas, que liga a lagoa ao mar, além de entupido, não daria vazão a toda esta água. Foi então que os Ministérios Públicos Federal e Estadual entraram em cena, numa atuação exemplar de ampliar a capacidade da Lagoa Feia para absorver água da chuva.

De que forma, a situação poderia ser revertida?

Para reverter esta situação, é preciso que o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e os governos de Campos, São João da Barra e Quissamã atuem conjuntamente para promover o reflorestamento ecológico da Serra do Imbé e para recompor as matas ciliares dos rios. As áreas de rios e lagoas invadidas por casas de ricos e de pobres devem ser evacuadas, cumprindo ao Poder Público providenciar moradias em áreas seguras para as pessoas de baixa renda. A ponte da BR-101 precisa ser redimensionada e a reforma da Estrada dos Ceramistas deve incluir pontes e outros sistemas adequados de circulação de água, não apenas uma operação tapa-buracos. A parte final do Rio Ururaí deve ter seus meandros restaurados e revitalizados. A operação de remoção de diques na Lagoa Feia deve continuar ainda este ano, na estiagem que já começou. Por fim, defendo a necessidade de encontrar mais saídas das águas para o mar, não apenas o Canal das Flechas, com manutenção durante todo o ano por trabalho manual, o que gera empregos.

Como investimentos como a construção de hidrelétricas às margens do rio pode mimpactar na nossa região? Como está a evolução deste processo de construção?

É quase indiscutível que a Bacia do Paraíba do Sul não comporta mais barragens, seja para regulação de águas, seja para transposição de bacia, seja para geração de energia elétrica. Da década de 50 para cá, estima-se que o rio tenha perdido cerca de 45% de sua capacidade de enfrentar o mar, o que acarretou os fenômenos do Pontal de Atafona. No entanto, uma barragem está em andamento e mais três previstas. Elas representarão um desastre para o rio e sua bacia.

Estudos no sentido de minimizar o impacto socioambiental nas regiões próximas ao Porto do Açu e Barra do Furado apontam que comunidades pesqueiras serão beneficiadas. Qual é a sua visão sobre isso?

Vejo com bastante pessimismo o conjunto de empreendimentos que se estenderá do Açu a Barra do Furado, com um complexo industrial-portuário no Açu, o aeroporto da Petrobras no Farol e um estaleiro acompanhado de outras iniciativas em Barra do Furado. Na fase de licenciamento das obras, tudo são flores. O ambiente não será atingido, os pescadores prosperarão e haverá controle do êxodo rural. Depois que tudo começar a funcionar, aparecerão os problemas. Prevejo que a área do Açu, e talvez da foz do Itabapoana, onde se planeja um porto do tipo do Açu, até Barra do Furado será uma Macaé menos pior. Isto porque a planície mostrou os cuidados que devem ser tomados. A siderúrgica chinesa no Açu é um agravante. Aliás, todas as grandes empresas que se instalarem no complexo industrial-portuário representarão um agravante. Por mais que as tecnologias tenham se sofisticado, os grandes empreendimentos causam grandes impactos socioambientais.

De que forma, o meio ambiente pode ser poupado na região?

Só vejo uma forma para isto: o estímulo a pequenos empreendimentos rurais e industriais de baixo impacto cujos proprietários sejam os próprios trabalhadores. Estas unidades produtivas não só ajudam efetivamente a combater a pobreza como ainda devem ter um compromisso com a produção de alimentos e com a proteção da natureza. Não consigo conceber que uma siderúrgica de grande porte, como se anuncia para o Açu, por maiores que sejam os cuidados em relação ao ambiente, não cause impactos sociais e ambientais.

Você está há mais de 30 anos nesta luta. O que mudou de lá para cá?

Estou no ativismo ecologista desde dezembro de 1977. Naquele tempo, fui considerado louco e ecochato. Hoje, a mentalidade avançou muito e muita gente me compreende, mas existe pouca ação em relação à consciência.

Além da perda de capacidade do Paraíba e de extensão da Lagoa Feia, quais foram os prejuízos na fauna e na flora de nossa região, explicando, foram consequências de que? (Por exemplo: no acidente de novembro, morreram além de várias espécies de peixes, pacas e outros animais) Os acidentes anteriores lançaram metais pesados e matéria orgânica. Os metais pesados contaminam plantas e animais aquáticos e entram na cadeia alimentar. Se um animal ou uma pessoa comer um peixe com mercúrio, cádmio e chumbo, estes metais se transferem para o organismo que ingeriu o peixe, mas as consequências à saúde não aparecem imediatamente. Mais tarde, o animal ou a pessoa pode apresentar problemas, como câncer, como exemplo. Quando se trata de matéria orgânica em soda cáustica, como foi o acidente de Cataguases, a mortandade de peixes ocorre porque a matéria orgânica absorve o oxigênio dissolvido da água e mata os peixes por asfixia. No caso do acidente com Endosulfan, plantas e animais aquáticos, e até terrestres, morreram por envenenamento direto. Nos casos anteriores, é como se plantas e animais tomassem uma pequena dose de cocaína diariamente. No final, é claro que isto vicia, mas não mata de imediato. No caso do Endosulfan, foi uma overdose.

O Ministério Público Federal instaurou inquérito civil para apurar a participação da União no empreendimento do Porto do Açu?

Ingressei, no Ministério Público Federal, como uma notícia sobre a ausência do IBAMA no processo de licenciamento do complexo industrial-portuário do Açu. O licenciamento está todo ele por conta do Instituto Estadual do Ambiente, menos o mineroduto, que, por ser interestadual, deve ser licenciado pelo IBAMA. Levando em consideração que o porto do Açu será construído no mar, que é domínio da União, o Ministério Público Federal está certíssimo: o IBAMA não pode estar ausente.

Por que a situação foi pior na região de Lagoa de Cima e Ururaí, este ano?

O que aconteceu de original nas chuvas do verão de 2008-2009 foi a conjugação de cheias na bacia da Lagoa Feia e na bacia do Paraíba do Sul, nesta, principalmente, no seu afluente Muriaé. Quando chove apenas em uma bacia, o problema não toma as proporções desta última cheia. Se a bacia do Paraíba enche e a da Lagoa Feia também, não há para onde escoar a água excedente, a menos que as lagoas drenadas e barradas sejam abertas. O problema é que nossos técnicos aceitaram sem discussão o sistema centralizado que o DNOS construiu para escoar as águas das cheias para o mar pelo Rio Paraíba e pelo Canal da Flecha. Dizem eles que a manutenção dos canais limpos resolve o problema. Não resolve. Na última cheia da planície, acumulou-se muita água, e o Paraíba e o Canal da Flecha, mesmo limpos, não deram vazão. É preciso pensar num sistema descentralizado, com várias saídas para o mar, com lagoas como área de escape e com o reflorestamento.Fonte: Portal do Meio Ambiente - Vilmar Berna


INSTITUTO SOS RIOS DO BRASIL
Divulgando, Promovendo e Valorizando
quem defende as águas brasileiras!
ÁGUA - QUEM USA, CUIDA!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seja bem vindo e deixe aqui seus comentários, idéias, sugestões, propostas e notícias de ações em defesa dos rios, que vc tomou conhecimento.
Seu comentário é muito importante para nosso trabalho!
Querendo uma resposta pessoal, deixe seu e-mail.

A legislação brasileira prevê a possibilidade de se responsabilizar o blogueiro pelo conteúdo do blog, inclusive quanto a comentários. Portanto, não serão publicados comentários que firam a lei e a ética.

Por ser muito antigo, o quadro de comentários do blog ainda apresenta a opção comentar anônimo; mas, com a mudança na legislação,

....... NÃO SERÃO PUBLICADOS COMENTÁRIOS DE ANÔNIMOS....

COMENTÁRIOS ANÔNIMOS, geralmente de incompetentes e covardes, que só querem destruir o trabalho em benefício das comunidades FICAM PROIBIDOS NESTE BLOG.
No "COMENTAR COMO" clique no Nome/URL e coloque seu nome e cidade de origem. Obrigado
AJUDE A SALVAR OS NOSSOS RIOS E MARES!!!

E-mail: sosriosdobrasil@yahoo.com.br