Usinas no Rio Tapajós alagarão áreas protegidas
Claudio Angelo, da Folha de S. Paulo, JB Online
SÃO PAULO - As cinco hidrelétricas que o governo planeja construir na região do rio Tapajós, no Pará, afetarão diretamente 871 km² de áreas protegidas de floresta, uma área equivalente a metade da cidade de São Paulo.
O cálculo foi feito pelo jornal Folha de S. Paulo com base em dados do estudo de inventário hidrelétrico dos rios Tapajós e Jamanxim, produzido pela Eletronorte e pela Camargo Corrêa.
Segundo o relatório, preliminar, deverão ser alagadas pelos reservatórios das usinas porções de dois parques nacionais e três florestas nacionais. Somados, os reservatórios das cinco hidrelétricas terão 1.979 km² de área.
Parques nacionais são unidades de conservação integral. Nenhum tipo de atividade que não seja a pesquisa científica ou o turismo é permitido nessa categoria de área protegida.
Na área de influência das usinas existem dois: o parque nacional da Amazônia, o primeiro a ser criado na região Norte, em 1974; e o parque nacional do Jamanxim, criado em 2006.
As Flonas permitem exploração econômica sustentável, mas não permitem a instalação de usinas hidrelétricas.
Isso, porém, está mudando. No dia 9 de abril, o governo publicou um decreto que permite autorizar estudos para hidrelétricas em quaisquer unidades de conservação, bem como instalar linhas de transmissão em unidades de uso sustentável.
O decreto tem por objetivo liberar a realização dos estudos e relatório de impacto ambiental (EIA-Rima) das usinas do Tapajós, condição necessária para o licenciamento das obras.
Hoje, eles não podem ser feitos porque a lei do Snuc (Sistema Nacional de Unidades de Conservação) não permite que um parque autorize atividades que visam alterá-lo. Ou seja, os técnicos da Eletronorte não podem nem mesmo entrar nos parques para fazer, por exemplo, levantamentos das áreas a serem afetadas. No inventário, as estimativas foram feitas com base em fotos aéreas e medições feitas de dentro dos rios.
Após as polêmicas ambientais envolvendo as usinas do rio Madeira (RO) e Belo Monte (PA), o governo estuda com cautela seus próximos passos energéticos na Amazônia.
A região do Tapajós tem, por um lado, um potencial enorme: é a última área de queda entre o Planalto Central e a bacia amazônica que ainda não tem uma megausina. Esta, São Luiz do Tapajós, a principal do complexo, deverá ser a terceira maior do país, com 6.133 megawatts de potência instalada.
Por outro lado, a região é rica em biodiversidade e abriga uma das principais porções de floresta intocada do Pará.
Praticamente toda a zona de influência das hidrelétricas está em unidades de conservação, a maioria no rio Jamanxim. Elas foram criadas em 2006, como parte do plano de contenção do desmatamento no eixo da rodovia BR-163.
Só no parque nacional da Amazônia foram registradas 425 espécies de ave, 370 de planta e 103 de mamífero. "Essas informações são parciais, porque os levantamentos só foram feitos nas áreas de fácil acesso", ressalta Allyne Rodolfo, bióloga do parque.
O ministério de Minas e Energia aposta em um novo conceito de hidrelétrica para essas áreas sensíveis: as "usinas-plataforma".
Segundo o ministro Márcio Zimmermann, as usinas-plataforma são construídas de forma a minimizar o desmate. Após a construção, os canteiros de obras são abandonados para que a floresta se regenere.
O conceito ainda não foi testado em lugar nenhum do mundo. "Parece ser mais um exercício de 'greenwash' [propaganda enganosa verde] do que uma proposta séria", afirma Aviva Imhof, da ONG International Rivers Network.
Para isso, inspirou-se na forma como as plataformas de petróleo são feitas e operadas. A ideia é evitar o crescimento explosivo das cidades e do desmatamento, até hoje consequência obrigatória da construção de usinas.
Segundo o ministro de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, o conceito de usina-plataforma nasceu de "uma constatação de realidade": há muito potencial para explorar em áreas não antropizadas, mas ninguém quer mais o desenvolvimento predatório da Amazônia.
"Você já viu nascer alguma cidade em uma plataforma marítima?" -questiona. Segundo ele, a construção seria feita de forma a impactar só a área do canteiro de obras, que seria depois abandonada para a regeneração da mata. A operação posterior das usinas-plataforma seria feita remotamente. "Isso inclusive reduz o custo", diz Zimmermann.
Folha de S. Paulo
INSTITUTO SOS RIOS DO BRASIL
ÁGUA - QUEM USA, CUIDA!
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