Desastre em Nova Friburgo - RJ
Exploração indevida dos desastres da Região Serrana/RJ
Osvaldo Ferreira Valente
Apesar de sabermos que fenômenos naturais são capazes de provocar desastres, a violência com que eles atingiram a Região Serrana do Rio de Janeiro foi de assustar e provocar muita tristeza. Precisei de coragem para acompanhar, via televisão, todo o desespero da população atingida e até mesmo me indignar com a falta de tato de muitos repórteres que não se acanhavam de perguntar o que a pessoa estava sentindo, depois de a mesma ter acabado de informar a perda vários membros da família.
Passada a comoção, tenho buscado explicações técnicas para ajudar na compreensão dos acontecimentos e, assim, alertar para as medidas necessárias à não repetição de desastres semelhantes. Acredito ser esta uma obrigação minha, pois, como aposentado de uma Universidade Federal, recebo meu salário de impostos pagos pela sociedade brasileira. Mesmo não estando mais na ativa, não vejo cessadas as minhas responsabilidades. Mas ando indignado com muitas coisas que tenho lido para me inteirar dos fatos. Há tentativas de simplificar as razões e, em muitos casos, as manifestações chegam mesmo a caracterizar uma certa desonestidade intelectual.
Vi muitas entrevistas de pessoas que não sei a razão de estarem falando sobre assunto, pois nas primeiras frases já dava para perceber o completo desconhecimento dos fenômenos ocorridos. Houve, por exemplo, uma profusão de culpas debitadas ao desmatamento de encostas, quando as fotografias mostravam deslizamentos de áreas totalmente cobertas com mata natural. Será que não houve o cuidado prévio de analisar as fotos que estavam sendo divulgadas em grande quantidade? Ou estavam usando de oportunismo puro para dizer que a reforma do Código Florestal irá provocar mais desastres semelhantes? Já escrevi dois artigos para o EcoDebate ( 18/01 e 27/01 de 2011), tentando explicar o porque dos deslizamentos em tais circunstâncias e como são formadas as torrentes que vão levando tudo pela frente. Mencionei, inclusive, que as matas ciliares não foram e não seriam capazes de evitar o deslocamento da grande massa de lama formada.
A foto anexa ilustra o que acabei de falar: encostas deslizaram levando toda a vegetação arbórea que as estavam revestindo; casas, nos sopés do morros, também foram arrastadas; com muita chuva, tudo foi virando lama, descendo, juntando-se às lamas de outros deslizamentos e aumentando o poder de destruição. O Código Florestal, mesmo se fosse aplicável ao meio urbano, não resolveria o problema. Alguns até aproveitaram para, antecipadamente, culpar o deputado Aldo Rebelo, relator da reforma do Código na Câmara Federal, por desastres semelhantes no futuro.
Tenho muita pena das árvores, pois se pudessem falar elas certamente reclamariam de todas as esperanças que lhes são debitadas. Já virou até modismo a publicidade que diz ter sido a poluição provocada por uma determinada atividade compensada com o plantio de árvores. Ações desse tipo não são, na maioria dos casos, suficientes para promoverem o estabelecimento de ecossistemas eficientes na conservação ambiental. Além do mais, elas revelam o pensamento simplista de que podemos ocupar indefinidamente a superfície da Terra com florestas.
Apesar de não ter nada contra o Código Florestal, como princípio, discordo de seu caráter geométrico e daqueles que se agarram a ele como salvação nacional. Ele trata, na verdade, de parte pequena de tudo que precisa ser levado em consideração para a conservação dos nossos recursos naturais. Precisamos, sim, de um Código Ambiental que estabeleça fundamentos para ações comunitárias, determinadas no dia a dia por Comitês de Biomas ou de Bacias Hidrográficas, por exemplo,
Mas felizmente consegui ver coisas boas, como os artigos e entrevistas do geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos (vide o publicado no EcoDebate de 02/02/2011, em parceria com o arquiteto e urbanista Francisco Luiz Scagliusi). Também fiquei feliz com a notícia de que será feito um estudo geológico de toda a região atingida, visando demarcar e classificar as áreas de risco. Ficaria mais feliz, ainda, se as pessoas que não são especialistas em assuntos relacionados, ao se manifestarem publicamente, se limitassem a cobrar providências das autoridades, exigindo estudos técnicos apropriados ao planejamento de ações preventivas. Os generalistas interessados poderão prestar excelentes trabalhos se se contentarem em apontar as doenças que acometem os ambientes naturais, mas poderão provocar outros desastres se passarem a receitar procedimentos e remédios.
Osvaldo Ferreira Valente é engenheiro florestal, especialista em hidrologia e manejo de pequenas bacias hidrográficas e professor titular, aposentado, da Universidade Federal de Viçosa (UFV); colaborador e articulista do EcoDebate ovalente{at}tdnet.com.br
EcoDebate, 08/02/2011
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