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2 de dezembro de 2009

MESTRE OSVALDO VALENTE DA UFV ESCLARECE E ALERTA SOBRE MATAS CILIARES

Se não fosse destruída a mata ciliar a situação aqui seria melhor? verdade ou lenda?

Mata Ciliar: Mitos e Verdades

    Osvaldo Ferreira Valente

Professor titular aposentado da UFV

e especialista em hidrologia e manejo

de bacias hidrográficas

No momento em que se fala muito sobre revitalização de bacias hidrográficas, em razão da polêmica sobre a transposição do rio São Francisco, vem sempre referência à mata ciliar ou ao reflorestamento ciliar, mas com muita confusão a respeito de suas verdadeiras funções. E como é importantíssimo que os agentes responsáveis pelos trabalhos de revitalização tenham a exata compreensão dos mitos e verdades em torno do assunto, é que estamos nos propondo, aqui, a abrir uma discussão em torno dele.

É verdade que a mata ciliar é capaz de criar um ambiente mais natural em torno dos corpos d’água, colaborando para o estabelecimento e o desenvolvimento de uma área com características interessantes de biodiversidade. É também verdade que ela pode funcionar como um anteparo às ações antrópicas mais diretamente agressivas e criar abrigos importantes para a fauna silvestre e para espécies vegetais típicas da região.

É só parcialmente verdade a decantada capacidade de a mata ciliar proteger as nascentes e os cursos d’água de assoreamentos e contaminações químicas. Isso porque as estreitas faixas de preservação permanente, ao longo de cursos d’água menores, principalmente em regiões montanhosas, não são suficiente para segurar todo o material arrastado por ações degradantes promovidas em toda a superfície da bacia.

Já com relação às contaminações químicas, as ações benéficas da mata ciliar na retenção de substâncias carreadas para as nascentes, córregos e rios são muito variáveis, dependendo tanto das características dos elementos poluentes quanto das propriedades físicas e químicas do perfil do solo até os lençóis subterrâneos. A solução para evitar tais contaminações deve estar muito mais no trabalho de capacitação de produtores rurais para o uso adequado de defensivos agrícolas. É mais lógico e mais eficiente, com certeza, pois tira do problema aquele risco de ser transformado em plataforma profissional daqueles que só sabem relacionar e tentar vender utopias.

É um mito a idéia de que a mata ciliar é capaz de aumentar vazões de nascentes e de cursos d’água nas épocas de seca. Tal impressão deve vir da observação de situações localizadas, onde a mata ciliar está integrada a superfícies florestadas e com áreas de tamanhos suficientes para não funcionarem como oásis energéticos. Os ecossistemas hidrológicos, nestes casos, têm equilíbrios bem naturais, evitando concentrações em superfícies vegetadas e úmidas das partes mais baixas, o que poderia gerar altas taxas de evapotranspiração. Mas hoje os ecossistemas estão em contínua alteração e é bobagem pensar em estabelecer grandes áreas de vegetação arbórea nativa na maior parte das regiões brasileiras, já ocupadas com sistemas econômicos de difícil alteração drástica.

Há de se achar soluções tecnológicas para que tais sistemas possam ser também sustentáveis do ponto de vista hidrológico. E a verdade hidrológica a ser atendida é que os lençóis equilibrados com as nascentes e com os cursos d’água não estão posicionados só abaixo das áreas ciliares. Se estiverem abaixo de encostas degradadas, por exemplo, elas passam a ter maior importância hidrológica do que as primeiras.

Em casos de extrema degradação das encostas das bacias, as matas ciliares poderão até colaborar com a diminuição de vazões de seca, pois uma concentração de energia em seus domínios será capaz de manter altas taxas de evapotranspiração em um ambiente em que as raízes das árvores, se profundas, estarão se desenvolvendo em solo sempre úmido, mesmo na ausência de chuvas.

Outro grande mito é a crença de que a umidade presente nas áreas ciliares, mesmo nos períodos de seca, seja uma condição originada ali mesmo. As áreas ciliares são, na verdade, áreas de passagem de águas que se deslocam das partes mais altas dos lençóis em direção às nascentes e aos cursos d’água. O ecossistema hidrológico está distribuído por toda a bacia e não é um privilégio das áreas ciliares, que são apenas componentes dos mesmos e assim devem ser tratadas.

Enfim, as pessoas que trabalham com ou falam sobre o assunto não podem incorrer no erro de adicionar, às funções ambientais das matas ciliares, comportamentos hidrológicos que elas não têm, evitando futuras frustrações.

ovalente@tdnet.com.br

O ISOSRiosBr agradece ao Mestre Osvaldo Valente (hidrologista da UFV) pela valiosa colaboração, enviando orientações e artigos sobre "mata ciliar" que estamos publicando no Blog.

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