O maior depósito de água do mundo
Por Sérgio Adeodato, da revista Horizonte Geográfico
12/05/2009 - 01h05 - Envolverde
São 46,2 mil km3, divididos entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Boa parte já está sendo explorada. Mas é preciso superar os problemas de uso excessivo e contaminação.
Quando se fala sobre os rios brasileiros, responsáveis por 12% de toda água que flui na superfície do planeta, é comum ouvir que somos o país mais rico em recursos hídricos. O superlativo vale também para as reservas escondidas no subsolo. O Brasil tem um estoque de água subterrânea equivalente a um quinto da existente em todos os aquíferos do mundo. É volume suficiente para abastecer continuamente 2,8 bilhões de habitantes dentro dos padrões de consumo recomendados pela Organização Mundial da Saúde.
O uso desse tesouro depende, é claro, das condições geológicas e de outros fatores locais. Mas uma coisa ninguém duvida: é água demais! Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 61% os brasileiros são servidos por essas fontes hídricas, espalhadas por dez diferentes regiões hidrogeológicas, mapeadas conforme as condições de armazenamento, circulação e qualidade da água.
Um mar debaixo da terra
Há dois tipos principais de aquíferos. Nos saturados, a água se aloja por entre granitos e rochas cristalinas, sendo mais difíceis de explorar. No caso dos aquíferos porosos, as reservas são normalmente fartas e acessíveis. O exemplo mais importante nessa segunda categoria é o Aquífero Guarani, formado entre camadas de rochas arenosas, depositadas na Bacia Geológica do Paraná entre 245 milhões e 144 milhões de anos atrás.
O Aquífero Guarani estende-se por 1,195 milhões de km2. A maior porção (71%) está em território brasileiro e aqui é aproveitado. No Estado de São Paulo, 80% dos municípios dependem dessa fonte para servir um total de 5,5 milhões de habitantes. Marília, Jales eAraraquara, entre outras cidades, em vez de pagar pelo tratamento de água dos rios já bastante poluídos, optaram por poços profundos para abastecer a população, as indústrias e as propriedades agrícolas.
Há estâncias hidrominerais nas quais a água que brota no chão é termal, ou seja, quente, e apreciada por turistas em busca de relaxamento. Em Araçatuba e Presidente Prudente, também no interior paulista, a água subterrânea passa por sistemas de resfriamento antes de ser distribuída à população. Pesquisadores agora sugerem que o calor dessa água (33ºC a 65ºC) seja utilizado para gerar energia.
Por causa do uso intenso, São Paulo é o estado brasileiro em que as fontes subterrâneas estão mais ameaçadas. Bombas de sucção retiram água do subsolo com uma rapidez maior do que a natureza repõe. A exploração exagerada baixa o nível do lençol freático e torna a água suscetível à poluição que vem da superfície. A maior parte das cidades despeja esgoto sem tratamento. O risco de contaminação dos agrotóxicos completa o quadro nas zonas rurais.
O Projeto Aquíferos, criado pelo governo paulista, procura identificar áreas em perigo, controlar a poluição e promover campanhas para a limpeza de poços. “Além da falta de conhecimento sobre como usar o aquífero, o principal problema que enfrentamos é a abertura de poços clandestinos”, afirma Everton da Costa Souza, presidente da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (Abas).
Um modelo de acordo para o Aquífero Guarani
Como secretário-geral do Projeto de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Sistema Aquífero Guarani, o engenheiro Luiz Amore articulou governos, instituições e os principais pesquisadores que trabalham tanto no Brasil como na Argentina, Paraguai e Uruguai com um objetivo: mapear e dimensionar o potencial da reserva, identificar ameaças e iniciar o diálogo entre as nações que compartilham a água. Especializado em hidrogeologia, Amore, que já havia operado a cobrança pelo uso dos rios no Brasil, está agora em Montevidéu, de onde falou para Horizonte Geográfico.
Horizonte Geográfico – O Aquífero Guarani é considerado um tesouro desconhecido. O que tem sido feito para aproveitá-lo bem?
Luiz Amore – O conhecimento é a principal arma para protegê-lo. O projeto que coordenamos chegou a resultados importantes. Durante seis anos, com US$ 13 milhões do Banco Mundial, o trabalho envolveu 300 técnicos dos países participantes e mais de 2 milhões de pessoas tiveram contato com os experimentos de campo. Foi confeccionado um mapa a partir de 191 cartas topográficas e uma base de dados com informações sobre mais de 7 mil poços, acessíveis para consulta na internet. É o ponto de partida para aproveitar esse manancial de maneira sustentável. A partir disso, foram realizados experimentos piloto de como monitorar o uso, como ocorreu em Ribeirão Preto (SP), para depois o modelo ser replicado nos países.
HG – Qual a perspectiva de um acordo internacional para garantir o uso pacífico dessa água?
Luiz Amore – Os países criaram leis e programas internamente, estabeleceram ações conjuntas que agora serão implementadas a partir do maior conhecimento técnico sobre o manancial. Foi criado o Conselho Regional de Cooperação, integrado por agências de recursos hídricos e áreas de meio ambiente e relações exteriores, com sede no Uruguai. De imediato, o trabalho fará parte do Tratado do Rio da Prata. O Parlamento do Mercosul está trabalhando para aprovar um novo tratado.
HG – O projeto confirmou que o aquífero é descontínuo, diferente de uma região para outra. É um mito dizer que o Guarani é a solução para abastecer os países?
Luiz Amore – As pesquisas mostraram que os efeitos e prejuízos da superexploração e da contaminação são prioritariamente locais. Em muitos casos, como ocorreu em Concórdia (Argentina) e Salto (Uruguai), é preciso impor limites de uso. Essa realidade varia de país para país. Por isso, o controle e o modelo de uso devem ser locais
Fontes não aproveitadas do Nordeste
Aquíferos no subsolo nordestino são pouco utilizados. Eles poderiam atender boa parte da população que hoje sofre com a seca
Os sertanejos que rezam por chuva no cenário nordestino não sabem que, sob seus pés, está a solução de todos os problemas. Os contornos do mapa hidrogeológico da região são claros: em lugares onde o calor tórrido seca os rios, a água subterrânea se estende por toda parte. “O semiárido é uma ilha cercada de água doce por todos os lados”, afirma o pesquisador Sebastião Pinheiro da Silva, da Unicamp. “Infelizmente é uma reserva muito pouco aproveitada, enquanto milhões de reais são gastos para fazer, por exemplo, a transposição do rio São Francisco.”
Polêmicas à parte, o Nordeste brasileiro tem 90% do território constituído por rochas cristalinas com fendas e fissuras. Em apenas 10% da região há rochas.
(Envolverde/Revista Horizonte Geográfico)
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José do Patrocínio Tomaz Albuquerque (patrociniotomaz@uol.com.br)
A afirmação contida no artigo/título é equivocada e falaciosa. Nenhuma unidade, sub-sistema ou sistema aqüífero vale pelo que ele armazena, mas pelo que ele ele coloca à disposição do meio ambiente por meio do escoamento à rede hidrográfica, aos oceanos, mares, lagos e, mesmo, reservatórios superficiais, naturais ou artificiais.
Esta parte é que constitui a descarga natural de água subterrânea que é função direta da recarga igualmente natural. É esta descarga que pereniza rios e supre a demanda de ecossistemas naturais no intervalo entre períodos chuvosos, e não deve ser afetada de modo a inviabilizar o regime dos acidentes hidrográficos e a vida vegetal e animal dela dependentes. Portanto, o que resta importante em qualquer reservatório não é o volume nele armazenado, mas o seu escoamento, a sua vazão média anualmente descarregada.
Neste sentido, o Guarani tem recarga direta de apenas 26 Km³/ano (in Rebouças, 1999), o que representa, para a área de ocorrência do reservatório, de 1.125.000 Km², 23.111 m³/ano.Km², ou, apenas, 0,733 L/s.Km². Esta abordagem mostra o porque dos problemas de sobreexploraçào local do aqüífero. Na verdade, ele é pobre em produção natural.
Qualquer aqüífero Europeu, Asiático, Ameriacano do Norte produz 2, 5, 10, 50 vezes mais do que isso. Conclusão: a afirmação ufanista é, sem dúvida equivocada e falaciosa, servindo, apenas, para despertar a cobiça alheia diante dos problemas de abastecimento hídrico do Mundo.
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