EcoDebate, 08/08/2009
A Cidade do México está sofrendo com rachaduras gigantes no solo que ameaçam comunidades inteiras. De acordo com as autoridades, o problema se deve ao excesso de extração de água na capital e nos arredores, onde o solo não é estável. Dados oficiais revelaram que há risco de afundamento em oito delegações da cidade, onde vive mais de um milhão de pessoas.
Os moradores de Villas San Martín, no município de Chalco, a leste da Cidade do México, levaram um susto no início de junho, quando um forte ruído foi ouvido e várias casas tremeram. Reportagem de Alberto Nájar, da BBC Mundo no México.
Do lado de fora, eles encontraram uma rachadura de quase um quilômetro de extensão e seis metros de largura.
“Escutamos um barulho muito forte que vinha de baixo, e logo vimos que o chão estava se abrindo. Me assustei porque tudo aconteceu em poucos segundos”, disse à BBC a moradora Martha Ortíz.
‘Círculo Vicioso’
As rachaduras no solo se tornam mais frequentes na época de chuvas, que começa em maio e termina em setembro. Segundo Jorge Legorreta, da Universidad Autónoma Metropolitana, o problema se agravou nos últimos dez anos.
“A cidade não tem fornecimento de água de fontes externas e a situação foi resolvida com a extração do subsolo. É um círculo vicioso difícil de ser rompido”, explica ele.
Legorreta alertou que as fendas no solo continuarão aparecendo enquanto não se encontrar uma alternativa para a prospecção de água.
A população que vive em terrenos com minas e túneis subterrâneos também está em risco permanente.
“É um problema que já tem muitos anos e que estamos resolvendo, mas no passado casas inteiras se afundaram”, diz o administrador local José Luis Zamorra.
Túneis e minas
Desde 1930, várias regiões foram escavadas para que terra e pedras fossem usadas na construção da Cidade do México. As minas e túneis foram fechados, mas sem que os buracos fossem preenchidos e sem que eles fossem mapeados.
Infiltrações de água, o peso das casas e a circulação de carros na superfície acabaram debilitando o teto e as paredes das minas, aumento o risco de desabamento.
“Fizemos estudos de geofísica rua a rua em algumas regiões para encontrar (os túneis e minas), mas alguns foram escavados a 40 metros de profundidade. Uma vez localizamos um que tinha três níveis”, contou o Zamorra.
Apesar dos perigos de se viver em zonas de risco, a capital mexicana continua crescendo e as áreas de maior expansão são justamente os municípios ao redor da cidade, mais afetados pelo problema.
Nos últimos dez anos, cerca de 260 mil novas casas foram construídas, aumentando a pressão sobre o abastecimento de água. Fonte: EcoDebate, 08/08/2009
NOSSO COLABORADOR E ESPECIALISTA GEÓLOGO ÁLVARO RODRIGUES DOS SANTOS (IPT/USP) FALA SOBRE O ASSUNTO E O RISCO DE ACONTECER NAS CIDADES BRASILEIRAS QUE USAM ÁGUAS DE POÇOS PROFUNDOS.
A ÁGUA SUBTERRÂNEA ESTÁ SE TORNANDO CASA DA MÃE JOANA
Especialmente nas áreas urbanas as intervenções diretas e indiretas (poluição, extração, depleção) sobre a água subterrânea têm atingido níveis alarmantes, com conseqüências gravíssimas tanto sobre o próprio recurso hídrico, entendido como manancial de boa água para a sociedade, como sobre o comportamento geotécnico dos terrenos afetados por variações do Nível d’Água advindas de sobre-exploração do recurso ou de operações de rebaixamento do lençol associadas à implantação de obras civis.
As intenções dos diversos níveis responsáveis da administração pública em regulamentar e controlar as ações que de alguma forma interferem com a água subterrânea no meio urbano não têm ido além de discursos e promessas vazias. Difícil hoje não se encontrar motéis, hotéis, academias de ginástica, grandes empreendimentos civis das mais variadas naturezas que, legal ou ilegalmente, instalam e operam poços profundos de extração de água subterrânea.
Se a instalação dos poços na maior parte das vezes já não se faz de forma legal e regulamentada, imagine-se o controle do regime de sua operação (vazões máximas/tempo permitidas).
De forma ainda mais anárquica projetam-se e operam-se ações de rebaixamento do lençol subterrâneo na construção de edifícios e outros empreendimentos civis.
Pior, esse tipo de rebaixamento que é concebido para ser hidrogeologicamente localizado e temporário (apenas pelo tempo de construção de pavimentos subterrâneos de um edifício, por exemplo), com muita frequência torna-se permanente, uma vez que o devido estanqueamento dos pisos subterrâneos é negligenciado e as conseqüentes infiltrações são solucionadas pela instalação de sistemas permanentes de bombeamento.
São sobejamente conhecidas as conseqüências geotécnicas do rebaixamento do lençol freático, especialmente em terrenos de características geológicas aluvionares com presença de camadas mais argilosas. Com a retirada da água de seus interstícios há um natural reacomodamento interno dos constituintes dos solos, o que leva, inexoravelmente à redução de seu volume e conseqüentes recalques em superfície e sub-superfície. São didáticos os casos de edificações em superfície afetadas estruturalmente por recalques advindos dos rebaixamentos associados à construção de linhas subterrâneas de metrô ou à construção de novos edifícios, como está a ocorrer no momento, e generalizadamente, nos bairros paulistanos do Itaim Bibi, Moema, Ibirapuera, historicamente assentados sobre terrenos de várzea.
A crescente impermeabilização da cidade, com incrível redução da taxa de infiltração das águas de chuva, agrava tremendamente as conseqüências das operações de rebaixamento do lençol freático. Para que não percamos o bom humor, lembremos que notórios profissionais nos garantem que, no caso paulistano, o fenômeno somente não é pior devido aos vazamentos das redes subterrâneas da SABESP.
Um caso particular da gravidade do não controle da exploração e manejo da água subterrânea acontece na região noroeste da região metropolitana de São Paulo, no âmbito e nos entornos do município de Cajamar, onde são comuns corpos calcários cársticos (com cavidades subterrâneas naturais). Nessas condições, o rebaixamento do lençol decorrente da operação de bombeamentos forçados constitui o agente potencializador e deflagrador de abatimentos geológicos de grande porte, como aconteceu no conhecido caso do Buraco de Cajamar.
Nesse contexto, onde um plano de radical ordenação e regulação de bombeamentos da água subterrânea se coloca como uma primária exigência de gestão de riscos geotécnicos, absolutamente nada se faz, deixando-se, temerária e irresponsavelmente, à mão do destino a eventualidade da ocorrência de gravíssimos acidentes.
Enfim, o problema é sobejamente conhecido, como também é conhecida a tradicional inação dos órgãos públicos naturalmente responsáveis por sua solução e equacionamento. Frente a esse quadro penso que responsabilidade maior cabe no momento às associações de classe e técnico-científicas de alguma forma ligadas à engenharia brasileira. Há já algumas iniciativas dadas nessa direção, a proposta seria constituir um Grupo Técnico de envergadura com a responsabilidade de elaborar os termos de uma legislação reguladora e fiscalizadora das intervenções sobre a água subterrânea em áreas urbanas. O resultado desse trabalho seria levado por essas associações, com seu peso político, às autoridades públicas implicadas em sua adoção.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
· Geólogo formado pela USP - Universidade de São Paulo em 1968
· Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia
· Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Cubatão” e “Diálogos Geológicos”
· Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
· Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia· Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Cubatão” e “Diálogos Geológicos”· Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente
(anexar comentário do Geol. Álvaro)
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