Golfinho famoso ofusca primos em risco no Brasil
O golfinho-rotador, típico de Fernando de Noronha, é o primo rico dos golfinhos brasileiros. Isso acontece por causa do patrocínio que a Petrobras oferece aos estudos com o animal, que não está em situação de risco, desde 2001.
Cientistas afirmam que, enquanto isso, outras espécies de golfinho do país que sofrem ameaças reais, como as toninhas do Sul, acabam ficando de lado.
Para Eduardo Secchi, oceanógrafo da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), o rotador chama a atenção por frequentar águas que os turistas acessam com facilidade e por ter o hábito de se aproximar dos barcos, dando piruetas fotogênicas no ar.
“Hoje, infelizmente, os recursos da Petrobras são investidos mais em espécies que têm apelo visual e quase nada em espécies que realmente têm problemas de conservação, como a toninha. A espécie está colapsando, classificada como vulnerável na Lista Vermelha de animais ameaçados de extinção por causa das mortes em redes de pesca. Mas os critérios são de marketing”, diz ele, que trabalha com a espécie sulina.
Pela metade – “Calculamos que, entre 1996 e 2004, a população de toninhas tenha caído pela metade. Mas a toninha é difícil de ser vista, não é um golfinho ‘bonito’, não salta”, diz o oceanógrafo.
Além das toninhas, veio a público em 2007 que a população de botos-cinza do Amapá era vítima de uma matança. O desejo era vender os animais no mercado internacional como isca de tubarão.
Entre 2007 e 2010, a Petrobras gastou R$ 2,5 milhões com o rotador. “Projetos do nosso laboratório vão de R$ 20 mil a R$ 30 mil por ano”, diz Secchi.
“Aqui não trabalhamos com nenhum financiador contínuo. Ainda existem poucos estudos no Brasil sobre como a pesca interfere na fauna marinha, por exemplo”, diz o biólogo Sérgio Estima, do Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental em Rio Grande (RS), que também trabalha com as toninhas.
“Responsabilidade ambiental é algo que a sociedade cobra”, diz Luis Fernando Nery, gerente de responsabilidade social da Petrobras. “Saber focar é importante para que os trabalhos tenham sucesso.”
Segundo ele, a política atual de empresa é acompanhar de perto uma quantidade menor de projetos, podendo assim dar mais atenção para cada um.
A Petrobras se concentra em cinco espécies marinhas. Além do rotador, as baleias franca e jubarte, o peixe-boi e as tartarugas do Projeto Tamar. Nery ressalta que a empresa lança editais públicos para selecionar os projetos de conservação que vai apoiar. “Temos em mente não deixar os projetos dependentes demais de nós.”
Segundo a empresa, até 2012 já terão sido gastos perto de R$ 500 milhões em projetos da área ambiental –recursos voluntários, sem nenhum tipo de vantagem fiscal em troca.
Marcos de Oliveira Santos, biólogo da Unesp, elogia a ação da empresa. “Ela alavancou projetos realizados em longo prazo e suas equipes foram e são importantes nos árduos trabalhos de conservação, utilizando animais-bandeira em projetos guarda-chuva”, diz.
“Não vejo nos recursos financeiros um empecilho maior para os estudos e conservação de mamíferos aquáticos no país. Não é só a Petrobras que financia estudos de cetáceos.”
Dinheiro – A história do Centro Golfinho Rotador, que está completando 20 anos, se divide em antes e depois da Petrobras. “Os recursos, no começo, eram de “paitrocínio”. Gastava a minha herança”, diz o oceanógrafo gaúcho José Martins, fundador do projeto.
Com o tempo, começou a perceber a necessidade de profissionalização, diz, inclusive para fortalecer a imagem do projeto.
“No começo, era eu quem dirigia o ônibus que trazia os turistas para ver as palestras de educação ambiental que eu dava. Até que me disseram: “Zé, as pessoas nunca vão achar que é o palestrante que dirige o ônibus, mas sim que é o motorista que dá a palestra.’”
Em 2001, com a criação da Petrobras Ambiental, o projeto de Martins passou a ser patrocinado. Esse braço verde da petroleira surgiu após várias crises ambientais. O final do anos 1990 foi marcado, na empresa, por sucessivos vazamentos de óleo. Em 2000, ocorrem grandes desastres ambientas na baía de Guanabara e em uma refinaria em Araucária (PR).
Contando crises menores, até o afundamento da P-36 em 2001, ela esteve envolvida em 95 acidentes em 15 meses.
Para os rotadores, entretanto, valeu a pena. Depois de 2001, foi possível estudar melhor a espécie. “Pude me concentrar em, por exemplo, escrever artigos científicos sem precisar ficar pensando que sou eu quem precisa ir ao banco”, diz Martins. “Sem dinheiro você não consegue fazer nada.” (Fonte: Ricardo Mioto/ Folha Online)/AMBIENTE BRASIL
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